No tempo em que longas críticas de teatro eram publicadas nos jornais, havia certa ideia de que qualquer um(a) era leitor(a) em potencial. O sujeito passaria pela seção de política, de economia e terminaria na de cultura, se não parasse antes na de esporte. Essa ideia era reforçada por certo culto à personalidade dos autores. Barbara Heliodora talvez tenha sido o caso mais emblemático, pois costumava apontar problemas nas obras com a mesma paixão com que elogiava outras. Criou-se a fama de que era temida pelos artistas, e era mesmo.
Havia um quê de sadismo na leitura de uma crítica negativa, algo semelhante ao que ocorre hoje com os espectadores de reality shows ao verem um participante ser eliminado. Esse aspecto folclórico da crítica teatral ficou para trás por diferentes motivos. Um deles é que o grupo de críticos de prestígio que escrevia em jornais deu lugar a uma geração plural que escolheu a internet como suporte, produzindo textos que se distanciam em estilo e intenção daqueles do passado. Embora ainda seja possível ler críticas na imprensa tradicional, a oferta de textos em sites especializados em teatro é infinitamente superior, consolidando a crítica como um gênero de nicho. Talvez tenha sido sempre assim, mas agora mais do que nunca.
É o que nos traz a uma pulsante questão: quem lê crítica teatral? Colocando de outra forma: para quem o crítico escreve? Ou, se quisermos ser mais dramáticos: para que serve uma crítica? Muitos sites postam textos depois que as peças saem de cartaz, pois o tempo de reflexão e escrita é mais prolongado. Esse texto mais ensaístico tem, portanto, uma função diferente daquela crítica de jornal publicada logo depois da estreia, que servia como um guia de consumo. Hoje qualquer um pode expressar seu julgamento de valor nas redes sociais, e costumamos mesmo dar atenção à opinião de nossos amigos, mesmo que sejam apenas amigos de Facebook. Assim, o crítico precisa realmente dizer algo singular – o que os melhores críticos do passado já faziam. É um sinal de reconhecimento quando uma crítica é compartilhada na internet pelo artista resenhado ou vai parar no seu portfólio, mas a função principal não é essa: é levantar discussão, provocar intelectualmente, desacomodar. Assim como um espetáculo, a boa crítica é aquela que envelhece bem.