O meu sonho de adolescência era ser um herói da guitarra. Ganhei uma dos meus pais na volta de uma viagem ao Exterior e tentava praticar com alguma frequência para me tornar um virtuose. Cheguei a me apresentar com banda uma vez ou outra, mas, como vocês podem ver, meu sonho fracassou de forma retumbante e virei jornalista. (Também me cansei um pouco da guitarra, mas vamos ficar com o argumento principal.) Falando assim pode parecer frustrante, mas talvez não. Porque hoje ninguém precisa muito de heróis da guitarra. As vendas do instrumento estão em queda livre no mundo e até marcas tradicionais vão mal das pernas.
Uma bela reportagem de Geoff Edgers do Washington Post publicada no ano passado (versão resumida em português aqui) chamou atenção para o fenômeno. Ele ouviu pessoas ligadas a esse universo e chegou a um dos diagnósticos: a falta de novos ídolos. Eddie Van Halen não inspira tanto os jovens de hoje. É difícil dissociar esse cenário da propalada morte do rock, que deixou de ser mainstream para se tornar uma música de nicho. Quem manda é o pop e o rap. No Brasil, também o funk e o sertanejo.
Tudo bem, são coisas da vida. Mas quando vejo minha guitarra guardada no estojo há anos não consigo evitar certo sentimento de culpa. Olhando para trás, a gente sempre acha que poderia ter feito mais. As aulas de guitarra ironicamente me abriram o horizonte para gêneros que eu considerava mais sofisticados musicalmente, como o jazz e a bossa nova. Nunca deixei de ouvir rock, mas quando voltei a ele já era tarde demais. Chuif.
A mesma reportagem do Washington Post revelou que uma pessoa tem sido responsável por despertar um pequeno sopro de interesse pela guitarra, muito mais em garotas do que em rapazes. Taylor Swift. Por ser mais conhecida como uma das maiores cantoras pop do planeta, muita gente nem se deu por conta que ela toca. Mas as garotas sim. Alguns caras no YouTube postaram uns vídeos meio cretinos comparando a habilidade de ases da guitarra ocupados com solos incrivelmente velozes e a suposta simplicidade do toque de Taylor. Os youtubers em questão não merecem nossa atenção. Taylor está inspirando uma nova geração de um jeito diferente, menos falocêntrico, digamos.
Quem precisa de heróis da guitarra hoje somos nós, viúvos do rock. Não acredito muito na morte das coisas, exceto da fita cassete, mas vejo a decadência do virtuose um pouco como o fim de um sonho de adolescência. Um sonho não realizado é menos triste do que um sonho que fica irrelevante. Podemos lamentar que a gurizada não é mais tão versada em clássicos como Led Zeppelin, Deep Purple e Black Sabbath, mas sempre teremos a oportunidade de recostar na poltrona ao som de Nirvana, Alice in Chains e Soundgarden com o mesmo prazer que nossos pais extraíam de Richard Clayderman, Ray Conniff e Peppino di Capri.