Na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, uma estudante de História passou a encarar com apreensão o momento de ir para a aula. Julia de Castro tem 20 anos de idade e, depois de cinco semestres, sofre as consequências de se haver declarado “conservadora” e favorável à reeleição de Jair Bolsonaro. Foi uma decisão difícil. Por experiência própria, sabia que no recinto acadêmico da UniRio, em geral, e do curso de História, em particular, reinava, absoluto e incontrastável, o que define como “pensamento único de esquerda”. O linchamento verbal que se desencadeou contra Julia nas redes sociais a assustou pela virulência das mensagens, que variavam do insulto à ameaça pura e simples de retaliações, inclusive físicas. A porta do inferno se abriu para a moça que violou o código de silêncio e submissão que vigora em ambientes de intolerância com grupos de mando bem definidos.
Julia redobrará cuidados quando estiver a caminho da UniRio. O mesmo quando voltar para casa. Vontade de ir ao banheiro, ou frequentar a cantina? Melhor se fazer acompanhar. Mas acompanhar por quem? Como revelou em entrevistas, não recebeu reações de solidariedade na sua turma. Não que não haja “conservadores” em seu entorno, ou mesmo pessoas “de esquerda” com espírito aberto, capazes de interromper uma injusta cadeia de perseguição. Há. Mas Julia sabe que é difícil desafiar a doentia marcha da intolerância, que ora faz rufarem tambores do constrangimento, ora acaricia comportamentos de adesão, algo que ela percebeu com clareza na relação professor-aluno desde que pisou pela primeira vez na universidade, quase três anos atrás. Como regra de sobrevivência, ela passou cinco semestres calada, sem tocar em política, o que também é inócuo porque manter-se neutra, principalmente em seu curso, não é uma opção. “Tem que se posicionar!” é o bordão sempre à espreita. Equivale a dizer, como na Omertà, que você deve render-se, e aceitar o cabresto do grupo que assalta sua consciência.
Ela conta ter sucumbido à “espiral de silêncio” por dias, semanas, meses. Mas em seu peito foi crescendo um duelo entre o medo e a coragem. Medo, nunca deixou nem deixará de ter, que é inerente à condição humana. Coragem, ela foi juntando para só agora se assumir. E está pagando o preço por pensar, refletir, ser senhora de suas ideias e, frente ao coronelismo intelectual, lembrar que a universidade deve ser o território da pluralidade e do debate livre. Sente-se sozinha, e a verdade é que estará mesmo – enquanto estruturas acadêmicas, tão pródigas em manifestações de apreço à democracia, permitirem-se, por ação de alguns e omissão de muitos, o direito de esmagar a liberdade de pensamento.
O ambiente de escolas e universidades deve ser livre, plural, em benefício da formação de gerações de brasileiros mais esclarecidos. Impor uma corrente de pensamento como via única de tráfego intelectual é uma violência inaceitável, além de reduzir a nobre missão de instituições públicas de ensino a praças de pedágio político-ideológico.
Julia ousou passar pela cancela, e a patrulha já está em seu encalço. Que não a alcance.