Oitenta anos passam num sopro. No domingo passado, o leãozinho Caetano Veloso fez 80; o camaleônico Bob Dylan já fez faz tempo e o leonino Mick Jagger fará daqui a um ano. Mas esses três são outros 500 – ops, outros 80. Pois há outros 80 anos que deveriam ser relembrados e provavelmente passarão em branco, embora ainda reste um tempinho para tentar algo, pois faltam 10 dias para a data. O fato é que no dia 22 de agosto de 1942, após um rosário de vexatórias e indecorosas protelações, o Brasil enfim declarou guerra à Alemanha nazista. Embora as tropas brasileiras só fossem consideradas aptas para tomar parte da luta na Europa quase dois anos mais tarde (os pracinhas embarcaram para a Itália em julho de 1944), naqueles estertores de agosto de 1942, o país finalmente decidiu se aliar ao lado certo.
Mas isso só aconteceu porque uma semana antes, o dia 15 de agosto de 1942 – 80 anos redondos na próxima 2ª feira – já havia entrado para a história nacional (e universal) da infâmia. Foi quando o submarino alemão U-507, comandado pelo capitão de corveta Harro Schacht, afundou nada menos do que seis navios mercantes brasileiros, no litoral de Sergipe e da Bahia, em águas territoriais do Brasil, matando, sem qualquer declaração prévia, mais de 600 pessoas, a maioria civis, dentre os quais mulheres e crianças. Só então Getúlio Vargas abandonou a chamada “neutralidade interesseira” e, sucumbindo à pressão popular, em especial a da União Nacional dos Estudantes, declarou guerra ao Eixo.
É uma boa ocasião para recordar, portanto, que dois dos mais próximos colaboradores de Vargas, os generais Góis Monteiro e Eurico Gaspar Dutra, eram (como de início o próprio Vargas) admiradores de Hitler, e francamente favoráveis ao nazismo, tendo Góis chegado a insinuar que o Brasil deveria declarar guerra à Inglaterra. Paradoxalmente, porém, após o alinhamento do Brasil com os EUA, tanto Góis como Dutra seriam os articuladores da “doutrina de segurança nacional” (que durante anos foi chamada “doutrina Góis”) – e que o fizeram em parceria com militares norte-americanos, em especial o general George Marshall, depois conhecido pelo Plano Marshall. Góis e Dutra aprenderam nos EUA que militares não deveriam se envolver em política. Góis chegou a escrever: “Nas lutas políticas, o Exército não deve passar do grande mudo – condição essencial de sua coesão e eficiência, e até mesmo de sua existência como instituição”.
Mas, finda a guerra, as ambições falaram mais alto. Ambos derrubaram Vargas; Dutra virou presidente, e Góis Monteiro, senador. Só que o presidente do qual eles puxaram o tapete logo voltaria ao poder, “nos braços do povo”. Ainda bem que a História só se repete como farsa e não é sempre que um capitão afunda um país, provocando uma tragédia.