Num belo e certo dia do verão de 1984 – mesma estação e ano no qual foi lançada minha tradução de On the Road/ Pé na Estrada, de Jack Kerouac, me catapultando para meus (primeiros) 15 minutos de fama –, fui atingido por um raio de perplexidade. Ao cair das nuvens da dúvida, ele me deixou encharcado no aguaceiro da vergonha. Sim, trotava eu pelo parque, pés no chão e cabeça nas alturas, quando fui assombrado por uma certeza paralisante: eu não sabia nada – n-a-d-a – sobre história do Brasil. Relutei, desafiei a mim mesmo e discuti com meus botões: "Claro que sei". E dei início às enumerações: "Teve o Cabral, as capitanias hereditárias, a chegada da família real, o Tiradentes – opa, peraí, Tiradentes veio antes –; daí o grito do Ipiranga, os farrapos, as barbas do imperador, então umas escaramuças e...o Getúlio Vargas".
Trinta e cinco anos, 2 mil livros consultados, mais de 20 escritos e cerca de 1 milhão de exemplares vendidos depois, posso assegurar que aquele choque de realidade – o confronto com minha constrangedora ignorância – gerou bons frutos. A destilação dessa experiência – e a certeza de que a história poderia ser pop, repleta de ação, aventura, som, aromas e transcendência – se deu no Canal Buenas Ideias, que mantenho no YouTube, com mais de meio milhão de seguidores. Da telinha para os palcos, foi... um pulo. E assim nasceu a peça Não Vai Cair no Enem, que tem percorrido o Brasil, em teatros quase sempre lotados. É um stand-up turbinado, com troca de figurino e maravilhosa trilha sonora, no qual discorro, entre graças e desgraças, sobre 500 anos de um país em construção.
Sei que é um tanto cabotino usar coluna de jornal em causa própria – ainda mais que Zero Hora já deu matéria sobre a peça. Mas não resisti. Afinal, além da glória que é estar de volta ao espetacular Theatro São Pedro – onde me apresento hoje e amanhã, às 21h, e domingo, às 18h –, ainda estarei na Feira do Livro no sábado, com um beat-bate-papo às 17h30min, no teatro Carlos Urbim, e, uma hora depois, autografando Textos Contraculturais, Crônicas Anacrônicas e Outras Viagens (L&PM), antes de subir esbaforido a Rua da Ladeira até o teatro.
Garanto que é um jeito bem legal de não só descobrir o que a geração beat tem a ver com a história do Brasil como também passar o Dia de Todos os Santos ou os Finados de forma divertida. Antes de ver quem ressurge dos mortos num domingo de Gre-Nal.