E o novo ministro da Fazenda, hein? Pelo amor de deus: vem da área e tem conhecimento técnico, mas há sérias dúvidas sobre seu caráter. Não parece ser sujeito de confiança. Agora, pior é o novo ministro da Justiça: esse sim, um sujeito perigoso. Arrogante, prepotente e com passado sinistro. E o pior é que todo mundo sabe que vai acabar virando o consultor do primeiro mandatário, tão logo vierem à tona as denúncias contra o homem da grana... Do bispo, nem se fala: sobe ao púlpito para pregar sobre os mistérios insondáveis da fé, mas seu principal objetivo é arrancar dinheiro dos fiéis, pois os convenceu a pagar por seus pecados – literalmente.
Os principais empresários do pedaço não denunciam o esquema, pois lucram com o superfaturamento das obras públicas. Enquanto isso, enclausurado no palácio do governo, um funcionalismo leniente e nepotista se apressa em ratear os melhores cargos e perceber os melhores salários. No centro de tudo, um Judiciário corrupto e beligerante, liderado por desembargadores dispostos a aplicar o velho ditado: "Aos amigos, tudo; aos inimigos, a lei".
Não, não precisa se desiludir, pois o que você acaba de ler não são as manchetes de ontem – mas também não são fake news, eu juro. É tudo verdade, apesar de ser uma realidade vivida no reino de tão, tão distante, embora o cenário esteja lá e não tenha mudado tanto assim. De todo modo, para evitar constrangimentos desnecessários (você sabe, as pessoas andam nervosinhas – algumas até enviam mensagens furibundas!), é prudente dar logo nome aos bois e data aos fatos.
Pois o período em questão se estende de março de 1549 a abril de 1557. E o local era a cidade de todos os pecados, erguida na Baía de Todos os Santos, para ser "um coração no meio do corpo" do Brasil: a cidade do Salvador, nossa primeira capital. E os personagens são todos muito reais. O ministro da Fazenda (ou "provedor-mor") era Antônio Cardoso de Barros, funcionário de carreira da Casa dos Contos de Lisboa – órgão administrativo famoso pelos desvios de verbas, sendo que vários foram atribuídos ao próprio Cardoso. O ministro da Justiça (ou "ouvidor-geral") era o desembargador Pero Borges, acusado, julgado e condenado em 1546 pelo desvio de verbas nas obras de um aqueduto em Portugal – e, depois de pagar multa, perdoado pelo rei Dom João III. O doutor Borges, era o melhor amigo de Pero Fernandes Sardinha, o pregador-cobrador, primeiro bispo do Brasil e rematado ladrão.
Mas quem era o líder do bando? Supõe-se que fosse dom Duarte da Costa, segundo governador-geral do Brasil, que veio para a Bahia com dois de seus filhos, que seguiam os passos do pai. Antes de embarcar, dom Duarte obteve pensão vitalícia para engordar seu salário, pois fora presidente do Senado da Câmara, em Lisboa. Ele sempre jurou que não sabia de nada do que rolava nas salas bem ao lado da sua, ali no Palácio do Governador. Mas nós vamos mudar issaí, talquei?