Meu primeiro encontro com a irrealidade se deu na Praça Maurício Cardoso, essa mesma agora em petição de miséria, ali no Moinhos de Vento (embora, até onde eu saiba, certo hotel e certo shopping a tivessem adotado, pequena compensação pelo monstrengo arquitetônico erguido ao seu lado – mas esse é outro assunto). O dito encontro ocorreu numa tarde de outono em 1967, com as folhas caindo a suspirar "cedo demais, cedo demais". Eu estava às vésperas de completar nove anos e fui bastante contrariado ao referido logradouro: achava que praça era lugar para piá. E eu já me sentia um guri de quase 10. Acontece que, em lá chegando, houve uma transmutação: a realidade pedestre se transubstanciou em magia onírica e o tênue véu do mundo real dissolveu-se diante de mim. O murmúrio de uma fonte, o lento farfalhar da folhagem, as cintilações da água no pequeno lago, luzindo como um espelho partido, o sol filtrando-se pela copa da majestosa figueira feito raios num vitral – tudo isso contribuiu para o alumbramento, é claro.
Dura realidade
Quando os anos de chumbo ganharam novas cores
Graças às plantas poderosas pude refazer uma viagem de infância
Eduardo Bueno