Em sua desconsolada tentativa de evitar a morte supostamente anunciada, os jornais, rádios e TVs do mundo inteiro decidiram, faz já um tempo, dar "voz" àqueles que, presumivelmente, são seus consumidores. Foi assim que leitores passaram a escrever, ouvintes a falar e telespectadores a aparecer, em geral sem mostrar a cara. Então, ali está você vendo TV e eis que espouca o tweet: "Olha eu aquiii, curtiiiindo esse shouzasso (sic) no sofá e aparecendo na telinha!!!!". Ou então, ouve um jogo tenso de seu time quando o microfone é aberto para um torcedor tecer platitudes ordinárias – em tom loquaz. No estádio ou num bar. Na velha seção de cartas do leitor, oásis no cipoal das prescindibilidades, ainda se pode escutar o eco eventual de uma voz pertinente ou, ao menos, dissonante. Mas experimente conferir os comentários nas páginas eletrônicas dos jornais – incluindo este em suas mãos (ou em sua tela).
Boa parte dos que comentam nos sites dos jornais ou mandam tweets para as TVs e rádios não confiam, não gostam e não acreditam na imprensa.
É de chorar.
Mas a questão que se impõe é que tal atitude da imprensa – ou, sei lá, dos departamentos de marketing que a dirigem – pode estar duplamente equivocada, já que, por um lado, parece inútil e, de outro, funesta. Resulta evidente que boa parte daqueles que comentam nos sites dos jornais ou mandam tweets ou textos de WhatsApp para as TVs e rádios não confiam, não gostam e não acreditam na imprensa. Desconfiar e/ou não gostar da imprensa é natural e eventualmente até saudável. A questão é que a maior parte dessa gente ignora ou despreza o papel que ela cumpre. Comportam-se como se estivessem no pântano das mídias sociais, com a mesma certeza da proteção do anonimato.
E parece haver um risco adicional nessa decisão de dar voz a esse bando: quem garante que os leitores de verdade querem saber a opinião de outros leitores? Quem assegura que os ouvintes querem ouvir o que acham os demais ouvintes? Quem decidiu que a opinião de alguns telespectadores interessa a todos? Desesperados para atrair um público que lhes foge por entre os dedos, os meios de comunicação podem não só ter trazido para seu seio aqueles que, no fundo – e pelos motivos mais equivocados –, os odeiam, como, ao fazê-lo, talvez estejam repelindo aqueles que são sua razão de existir: o leitor que lê, o ouvinte que escuta, o telespectador que assiste. E que pagam para isso.
Nunca defendi a obrigatoriedade do diploma para o exercício do jornalismo: acho que qualquer um pode escrever em jornal, falar na rádio e aparecer na TV – conquanto tenha o que dizer. De preferência, com algum estilo. E, se der, com uma pitada de elegância. Mas dar voz aos imbecis que abundam na rede? Por quê? Para quem? Até quando?
Eu, particularmente, só dou minha opinião se me pagam – o que, aliás, é o caso no presente momento. Isso me leva a crer que se você está dando a sua sem ganhar, talvez seja porque – pelo menos num certo sentido – sua opinião não vale nada. Não seria mais negócio, portanto, guardá-la para si?