Quando gostam de alguma coisa, se julgam algo "bacana" ou "maneiro", o que costumam dizer os brasileiros? Pois dizem: "Legal!". Mas num país que tantas vezes dispensou a lei e vive flertando com ilegalidades, não terá sido essa uma escolha um tanto imprópria?
Bom, mas não era sobre isso que eu queria falar. O que queria dizer é que recentemente um renomado advogado, francófilo, mui fluente na língua de Proust (a tal ponto que, numa encarnação anterior, bem pode ter sido o defensor de Luís XVI), um douto jurisconsulto, sobejamente elogiado até pelos ministros do STF (trata-se, segundo eles, de uma "sumidade que defende com denodo seu paciente"), pois dia desses o supracitado luminar pegou um voo de Porto Alegre para São Paulo (Latam – JJ 3296).
Foi em 26 de março, ali pelas 18h30min.
Tendo pago módicos R$ 50 a mais, ou usufruindo dos benefícios de frequent flyer, aboletou-se num assento "com mais espaço e comodidade para as pernas". A poltrona ficava numa das saídas de emergência. Como normas internacionais impedem que tais lugares sejam ocupados por passageiros com menos de 15 ou mais de 60 anos, a aeromoça aproximou-se de Sua Excelência e perguntou: "O senhor tem menos de 60 anos?". "Pois claro que tenho", latiu o interrogado, com fatuidade e aspereza, os olhos lançando chispas. Intimidada por tão inabalável convicção, a aeromoça aquiesceu e tratou de recolher-se logo à sua insignificância.
Não sei se foi a primeira vez que José Roberto Batochio mentiu em seus bem-vividos 74 anos. Nem se foi a primeira vez que Cristiano Zanin (sentado a seu lado) foi conivente com a mentira de um colega (ou de quem quer que seja). O que sei é que na quarta-feira ambos de fato vivenciaram algo pela primeira vez em suas vidas: sem que lhes restasse saída de emergência, entraram para a história como advogados do primeiro ex-presidente brasileiro a ter sua prisão decretada, e em segunda instância.
Uma pena, pois o cliente deles já havia assegurado lugar na história por um tipo bem diferente de pioneirismo: 15 anos atrás, ele se tornou o primeiro mandatário advindo das camadas populares a assumir o comando do Brasil em mais de 500 anos de história – o que, naquele longínquo janeiro de 2003, parecia ser um avanço. Mas agora, sem a vênia e a verve (e as mentiras?) de Batochio, é provável que esse mesmo ex-presidente se torne o primeiro a ir para a cadeia.
Talvez assim se faça justiça – e, para quem acredita no peso das decisões colegiadas em segunda instância, far-se-á. Mas para qualquer pessoa familiarizada com a história recente do Brasil, não resta dúvida de que havia ex-presidentes na fila antes desse. José Sarney e Fernando Collor, por exemplo, seguem soltos – e respirando. Oxalá possam um dia os três dividir a mesma cela. E se o atual ocupante do Palácio do Planalto juntar-se a eles, estaria então formado um quatrilho. Ou algo parecido. Aí sim, acho que ia ser bem legal.