Ganhou a humildade saudita. Perdeu a soberba argentina. Triunfou a luta, o sangue no olho. Foi derrotada a indolência, a confiança exagerada. Que aula de como encarar - e de como não encarar - um jogo de Copa do Mundo, qualquer jogo de Copa do Mundo. Não adianta nada 35 partidas de invencibilidade e favoritismo ao título sem foco e postura competitiva.
A Argentina teve os 10 minutos iniciais com Messi perdendo gol após jogada de Laranja Mecânica. Na sequência, gol dele, de pênalti, contando sem correr, caminhando e deslocando o goleiro. Três minutos e já tinha show. Tudo apontava para goleada, mas aí os deuses das Copas inverteram o roteiro e assinaram umas das páginas mais incríveis da história do futebol.
A Arábia Saudita virou, empurrada pela torcida que lotou o Lusail Stadium. O Catar só faz fronteira terrestre com a Arábia Saudita. Os sauditas invadiram o Lusail. Sua seleção chutou três bolas no gol. Duas no alvo, as duas que entraram em belos gols de contra-ataque. A Argentina só acordou no 2 a 1. Até então, imprimiu ritmo de treino. Mas aí era tarde.
Os sauditas se defenderam como se enfrentassem a morte. E com simplicidade, em duas linhas de quatro, mas se multiplicando no campos. De desacreditados após eliminação precoce na Copa da Ásia, quando até trocaram de técnico, o espanhol Juan Pizzi pelo francês Hervé Renard, eternizaram-se por Alá.
Messi sumiu após o gol. Talvez seja o tornozelo que, dizem na Argentina, está inchado. Da Maria parecia sem força, com medo de abrir a lesão muscular que quase o tirou do Catar. Foi o ponta-direito menos agudo que já vi.
A Argentina exagerou na estratégia de romper a linha de impedimento saudita. Perdeu o primeiro assim. Na segunda etapa, quando tentou fazer o seu jogo de passes, pois tem muito mais habilidade para isso, tomou o empate e se perdeu no caminho emocional.
O técnico Lionel Scaloni tentou mudar pelo banco. Tirou o meio-campista Papu Gómez, o novo Lo Celso, e colocou Julian Álvarez, atacaste do Manchester Cury, jovem promessa do futebol argentino. Claro que os sauditas se fecharam em linha de cinco, seis, chegando a quase sete minutos nos longos acréscimos de 10 minutos.
Que aula. Só ser muito melhor não basta. Tem de lutar e não olhar o adversário como tão inferior que dá para escolher a hora do golpe final. É bem possível que o México pague a conta. A Argentina entrará com a faca entre os dentes contra o México, pobre México, sob pena do vexame da eliminação na primeira fase.
A despedida de Messi começou da pior maneira possível. Se já dava um tango antes, imagine agora, tendo de assinar uma epopeia para não sair pela parta dos fundos da história das Copas.