Qualquer criança sabe de um pecado mortal que treinador algum pode cometer. Trata-se de lei universal do futebol. Vale para Grêmio, Inter, Araribóia, Barcelona ou Íbis.
Colocar a culpa toda de uma derrota nos jogadores, isentando a si mesmo de culpa ou culpas, é assinar sentença de morte para um técnico — mesmo que, eventualmente, este técnico tenha razão. É aquela história de acender a fritura em fogo baixo.
As queimaduras nunca vêm na partida imediatamente após, até por exigência da torcida, que cobra resposta anímica imediata. Estas queimaduras vão se formando nos jogos seguintes, aos poucos.
Este é o roteiro para os técnicos normais que, como Renato Portaluppi após a derrota do Grêmio para o Vasco por 1 a 0 em São Januário, criticam publicamente seus jogadores e até ameaçam fazer substituições ainda no primeiro tempo a quem não estiver "competindo".
Só que Renato não é um técnico normal. Mais do que isso: ele não é um técnico na história do Grêmio. Renato é uma lenda viva no Grêmio, sem exagero algum.
As relações dele com o clube e o vestiário não se regem por estas leis. Nenhum treinador do Brasil, hoje, conseguiu estabelecer tal nível de envolvimento com uma instituição no futebol. Atrevo-me a dizer: se Renato desse uma entrevista pós-jogo como esta, sua demissão seria questão de tempo. Não é o caso.
Uma das virtudes de Renato, talvez a melhor delas, é a de gestor de vestiário. Ele sabe resolver conflitos e criar comprometimento. Seus títulos (Gauchão, Copa do Brasil, Libertadores, Recopa Sul-Americana) e as boas campanhas das competições deste ano atestam esta realidade.
Portanto, vamos combinar que Renato não agiu intempestivamente, tanto que recebeu respaldo imediato unânime da direção. Sua bronca tem endereço certo.
Perder para o Vasco no Rio, mesmo com o adversário jogando com um a menos desde os 30 minutos do primeiro tempo, não é motivo para expressões como "estar envergonhado" e "levantar a cabeça", como expressou Beto Guerra, um homem comedido e sereno, em suas redes sociais.
Algo aconteceu lá no Rio de Janeiro. E foi grave.
O Grêmio vinha de uma atuação perfeita contra o Atlético-MG, no meio da semana, na Arena. Não fosse algo grave, Renato não tomaria atitude tão drástica, com ameaças aos jogadores, sendo apoiado incondicionalmente por seus superiores no clube.
De que forma, se este episódio será resolvido é o que saberemos logo ali adiante. O histórico de Renato indica sensibilidade incomum para perceber a hora certa do afago e do tranco. O fato é que, tendo de ajustar o time sem Arthur, ter o foco desviado por questões assim é tudo o que o Grêmio não precisa. Os jogos decisivos de Copa do Brasil (Flamengo) e Libertadores (Estudiantes) estão ali adiante.