Semanas atrás, o PG me ligou e disse:
— Tu tens que ler “Os Supridores”, do José Falero! Tens que ler!
E ficou insistindo:
— Lê! Lê!
Bem. Confesso que sempre hesito em ler jovens autores. Não que tenha algo contra eles, é que há muitos clássicos que ainda não li. Quer dizer: não vou me arriscar com quem não é consagrado, se há consagrados esperando por mim. Quando o jovem autor se tornar velho e conhecido, aí, sim, eu o lerei.
Mas o PG foi enfático e, nos dias seguintes, mandava mensagens: “Já leu Os Supridores? Já?”
Então decidi ler. Não me arrependi. Trata-se de um bom romance. Tem seus defeitos, óbvio que tem, mas cumpre bem as tarefas a que se propõe.
Não vou fazer uma exegese do romance, não é o espaço para isso. Apenas direi aqui o que mais me agradou nele: foi a relação do autor com a história. Falero escreve sobre o que conhece, e esse é um passo fundamental para se atingir sucesso como narrador. Falero é da Lomba do Pinheiro, tem intimidade com as vicissitudes por que passa a população mais pobre da cidade. O PG mesmo me contou que ele, Falero, trabalhou como supridor em um supermercado de Porto Alegre. Ou seja: ele fala o sobre seu mundo.
É assim que se faz a boa literatura, quando o autor transporta o leitor para o seu universo. Você lê Jorge Amado e se sente em Ilhéus, na Bahia. Você lê Erico Verissimo e se sente o gaúcho montado do fundo do Pampa. Você lê Dostoevski e se sente debaixo da neve de Moscou. Você compreende aquela realidade e se torna, por algum tempo, participante dela.
Isso acontece porque somos todos iguais. Não há muitas diferenças entre nossos sentimentos, nossas aflições e nossas alegrias. Na Vila Planetário, território de uma excitante cena final do romance de Falero, debaixo das cerejeiras do Japão, no alto das montanhas dos Alpes austríacos ou na calçada da Quinta Avenida, em Nova York, em qualquer lugar do mundo, os sentimentos básicos dos seres humanos são semelhantes. Todas as pessoas, inclusive as menos sociáveis, querem o amor das outras pessoas. Se não conseguem, bem, aí é que começam os problemas.
Um dos papeis mais importantes da literatura é esse, é mostrar que somos irremediavelmente irmãos. Assim compreendemos que os dramas de famílias abastadas do Moinhos de Vento podem ser os mesmos que atormentam os órfãos da Vila Lupicínio Rodrigues, outro cenário de Os Supridores.
Falero conseguiu isso, o que não é pouco. Não perdi meu tempo, ao ler Os Supridores. Não tenho medo de garantir que você não perderá o seu, ao lê-lo também.