Não existe voto errado. Não existe voto de qualidade inferior ou superior. As pessoas, quando votam, expressam seus sentimentos ou suas reflexões a respeito da sociedade em que vivem. Se elas estão se sentindo bem ou se acham que sua vida melhorou, votam na situação. Se estão irritadas por algum motivo, votam na oposição. Ou seja: todos os votos são legítimos, e mesmo não votar ou votar em branco é legítimo também. Essa é a essência da democracia.
Mas, no Brasil, não há, em lugar algum, tal compreensão. Para muitos intelectuais brasileiros, gente de grande prestígio na sociedade, quem votou em Bolsonaro votou errado. Para eles, o eleitor de Bolsonaro é desinformado, ou tolo, ou simplesmente mau.
Isso é terrível, porque é aos intelectuais que cabe interpretar o país. Se a interpretação é preconceituosa, o preconceito será imortalizado em papel, vira história, se torna verdade.
No entanto, a despeito das opiniões dos intelectuais, a aprovação do governo continua elevada. E, na última pesquisa, publicada nesta segunda-feira, as pessoas consideraram que houve má gestão na crise do Coronavírus, mas a maioria isentou Bolsonaro de responsabilidade.
Por quê?
Essa é a pergunta: por que grande parte dos brasileiros aprova Bolsonaro e votaria nele outra vez?
O que significa Bolsonaro para essas pessoas?
O que ele representa?
Não é necessário especular muito para concluir que Bolsonaro representa a rejeição ao tipo de governo que fazia o PT. Não que haja repulsa a políticas sociais, não é isso. O que irritou a população foi a perturbação da sua rotina diária. Protestos interrompendo vias públicas, às vezes paralisando uma cidade inteira; o aumento do número das invasões do MST; a Via Campesina destruindo pesquisas em laboratórios; as repetidas greves dos funcionários públicos. Junte-se a isso o medo das pessoas de sair às ruas, de parar com seu carro debaixo de uma sinaleira à noite, de abrir a porta da garagem para entrar em casa, mais a noção de que o Estado estava inçado de corrupção, e o resultado é a indignação.
O trabalhador que temia levar seu filho para brincar numa praça e que perdia a manhã num engarrafamento causado por meia dúzia de protestantes aos poucos foi se transformando em um revoltado.
Aos poucos, formou-se o conceito de que vida não estava boa para grande parte da população.
Está melhor agora? Talvez sim. Talvez essas pessoas se sentissem ameaçadas pelo governo, e agora não mais.
Essa reflexão precisa ser feita por todos, pelos que são a favor de Bolsonaro e pelos que são contra ele. Com serenidade, com isenção, sem ressentimentos, sem procurar culpas. A procura tem de ser, apenas, pela compreensão.
A maioria do povo brasileiro está dizendo algo, ao manifestar apoio a Bolsonaro. É preciso ouvi-lo. Mas só ouve quem quer ouvir.