Pessoas ferem e matam outras pessoas por dinheiro.
Pessoas ferem e matam outras pessoas por poder.
Pessoas ferem e matam outras pessoas por vingança.
Pessoas ferem e matam outras pessoas por ideologia, por religião ou até por futebol.
Existem vários motivos, todos eles ruins, para que pessoas firam e matem outras pessoas.
Mas agora, no Brasil, pessoas estão ferindo e matando outras pessoas sem motivo nenhum.
Na terça-feira (20), um homem sequestrou um ônibus no Rio de Janeiro e ameaçou matar os passageiros. Ele não havia assaltado ninguém, não tinha tentado roubar o ônibus e nem pediu resgate. Fez o que fez apenas por fazer.
Nesta quarta, um adolescente invadiu uma escola estadual de Charqueadas armado com uma machadinha e um galão de gasolina. Ateou fogo a uma sala de aula e agrediu alunos. Por quê? Ninguém sabe.
Houve, antes disso, outros casos, o mais notório o do ataque à escola de Suzano.
Nos Estados Unidos, esse tipo de crime tornou-se comum. Volta e meia, algum desequilibrado abre fogo contra alunos de uma escola ou contra jovens que estão se divertindo em uma festa. A diferença para o Brasil é que, nos Estados Unidos, os monstros (que é o que eles são) têm livre acesso a armas de fogo. Então, não é a machadinha ou o galão de gasolina que eles usam; é o fuzil de repetição, é a pistola automática, e o número de vítimas se torna bem maior.
Por que estamos fazendo o mesmo?
O que houve em nossa sociedade para que reuníssemos condições de nos contagiar com essa doença?
Não é a pobreza. O Brasil sempre foi pobre e há países ainda mais pobres que não padecem deste mal.
Não é a crise do sistema educacional. Os assassinos de Suzano, por exemplo, tinham bom nível de instrução.
Talvez seja uma reunião de fatores, incluindo a pobreza, a crise na educação, a degeneração moral, as tensões de um mundo cada vez mais competitivo e, o principal, o medo.
O brasileiro, hoje, é um povo que sente medo.
Medo da violência urbana, medo do desemprego, do trânsito frenético, das estradas esburacadas, de ser enganado pelo dono da fruteira ou pelo balconista da loja, medo do colega invejoso e do chefe autoritário, medo de não conseguir se aposentar nem de sustentar sua família. Muitas ameaças nos rondam, muito medo nós haveremos de sentir e não há sentimento mais perigoso do que o medo.
Não é por acaso que parcela da população quer andar armada, nem é por acaso que Bolsonaro se elegeu presidente usando, como símbolo de campanha, a representação do revólver feito com os dedos das mãos. Só se arma quem sente medo. Quem não sente medo, sente-se em paz. Quem se sente em paz não precisa andar armado.
O brasileiro, hoje, é um povo que sente medo.
O medo é o pior conselheiro, porque, quase sempre, ele se retroalimenta. Ele não é fruto da realidade, ele é produto do que a imaginação fabrica com os dados da realidade. Assim, o medo faz aumentar o medo. A pessoa sente medo de sentir medo. E, depois, vem a raiva. Como o rato acuado, que salta no pescoço do homem que pretende lhe dar a vassourada, o homem com medo ataca. Examine o perfil dos agressores, dos assassinos: sempre são homens introspectivos, sem amigos, tímidos. Eles sentem medo das outras pessoas. Por isso, atacam. Esses são os filhos que nossa sociedade insalubre está começando a gerar. Para nosso desespero, para nosso horror, para nossa miséria, estamos parindo ratos acuados.