O novo ministro da Educação quer que as escolas voltem a dar aulas de moral e cívica. Sugere que até universidades deem aulas de moral e cívica. Ele acredita que assim os alunos se tornarão patriotas, conhecerão mais o país e se tornarão bons cidadãos.
Tive aulas de moral e cívica. Fico chateado de decepcionar o ministro com meu testemunho, mas aí estava uma disciplina que nem eu nem meus colegas levávamos a sério. Havia outras: religião, artes domésticas… Outras ainda, mas não lembro como se chamavam.
Era muito difícil viver no Brasil e nenhuma aula de moral e cívica nos faria pensar o contrário.
Não é que detestássemos essas matérias, nós simplesmente não dávamos a menor importância a elas. Nenhuma. Zero. É provável que alguns professores de moral e cívica e artes estejam furiosos comigo neste momento. É provável que digam que fui mau aluno. É provável que eles estejam certos. Não posso dizer que tenha sido um aluno exemplar em nenhum momento da minha carreira escolar. Mesmo na faculdade havia disciplinas pelas quais não nutria o menor respeito. Mas não era só eu, juro. A imensa maioria dos alunos, senão todos, estava se lixando para morais e cívicas e que tais.
Isso talvez seja uma boa notícia para as pessoas que temem a “escola com partido”: crianças, mesmo com 10 ou 11 anos de idade, sabem o que é ou não é relevante. Elas não são tão “doutrináveis” como se pode pensar.
Nós, inclusive, naquele nosso tempo das aulas de moral e cívica, nós ouvíamos o dia inteiro que o Brasil era maravilhoso, que estávamos vivendo o milagre econômico e que seríamos o país do futuro. Os Incríveis cantavam que ninguém seguraria a juventude do Brasil. Na TV e no rádio, ecoavam os versos do jingle grudento das Olimpíadas do Exército: “Ooo, Olimpíadas… do Exército de todos nós!”.
Quer dizer: era para nos ufanarmos do nosso país, como diria o conde Afonso Celso. E, de fato, houve um momento de crescimento econômico, com Médici, muito parecido com o crescimento que houve depois, com Lula. Só que ambos os períodos de crescimento eram sustentados por bases frágeis e ambos foram sucedidos por crises poderosas. Resultado: ninguém mais se ufanava de coisa alguma.
Nós éramos guris, só pensávamos em jogar bola, não tínhamos o menor interesse em política, mas sabíamos que a situação não estava boa e por isso falávamos mal do governo e do país. Quando o governo militar acabou, em 1985, nós já tínhamos outras preocupações, além de jogar bola, por isso compreendíamos perfeitamente que a péssima gestão da economia havia desgraçado o Brasil. Não estou exagerando: “desgraçado” significa, realmente, levar à desgraça da inflação galopante, do desemprego, da dívida externa.
Era muito difícil viver no Brasil e nenhuma aula de moral e cívica nos faria pensar o contrário. Crianças e jovens são influenciáveis, sim, mas pela realidade em que vivem. Exemplos de civilidade produzem civismo. Exemplos de moralidade (não de moralismo) produzem moral. Boas escolas, com bons professores, bem pagos, produzem bons alunos. Que se tornarão bons cidadãos. Simples de entender. Complicado de fazer.