Um dia, o Big One vai devastar a Califórnia. Na quarta-feira mesmo, li essa advertência, no New York Times. E não se trata de profecia, não é nada de sobrenatural. É uma previsão científica.
Big One é o terrível terremoto que os cientistas SABEM que acontecerá algum dia naquela região lateral dos Estados Unidos. Em português, Big One poderia ser traduzido como O Grandão. Em gauchês, O Grandalhão. Os geólogos dizem que, quando ele vier, o solo se abrirá em uma fenda quilométrica, a terra tremerá como se sentisse febre e tsunamis aterrorizantes rolarão do meio do oceano para cobrir o campo e as cidades com água salgada e fel.
Os japoneses também têm o seu Big One, um terremoto que inevitavelmente virá e que partirá o Monte Fuji ao meio, como se fosse uma xícara de porcelana. Com esse pai de todos os terremotos, arranha-céus de Tóquio serão engolidos pela terra e a velha cidade arderá em labaredas por semanas a fio. Previdentes que são, os japoneses já elaboraram um plano para evacuar Tóquio em 24 horas. O que será uma façanha, porque só naquela concentração urbana esfervilham mais de 35 milhões de pessoas.
Os americanos talvez não tenham tanta proficiência, mas tentam ser igualmente previdentes. Ontem, nessa matéria que citei do New York Times, eles falam sobre os grandes prédios de San Francisco, que estão construídos muito perto uns dos outros e, pior, em terreno arenoso. Quando o Big One chegar, estimam os cientistas, essas peculiaridades podem ser fatais.
Isso me faz pensar: por que tanta gente vai morar nesses lugares que, na prática, já estão sentenciados? A lógica grita e clama que essas regiões deveriam ser evitadas. Mas não é o que acontece. Ao contrário: a Califórnia e a zona urbana de Tóquio estão entre as áreas mais populosas do planeta.
Por quê? E repito com maior ênfase: por quê???
Respondo: porque temos fé. É impressionante e comovente a nossa crença na justiça do universo. Coisas ruins acontecem todos os dias, mas você tem certeza de que está a salvo. Se você morasse na Califórnia e um cientista viesse adverti-lo de que o Big One ocorrerá qualquer dia desses, você responderia:
– Tudo bem, acredito, mas isso não vai acontecer justamente quando EU moro na Califórnia...
Por que não? Qual é a sua lógica?
Não há lógica. Há, apenas, fé. Alguém lhe disse que o bem vence no fim, alguém lhe disse que os maus serão punidos em algum momento. E você acreditou. Ou seja: como você é o protagonista da sua história, você é bom e você vencerá. Terremotos e tsunamis não o afligirão, a sua mulher é fiel, o seu time não cairá para a segunda divisão.
Porém, mesmo os homens religiosos são forçados a admitir que injustiças acontecem. Muitas vezes, os bons sofrem e os maus são recompensados, neste Vale de Lágrimas. As religiões resolvem isso apostando numa espécie de julgamento em quarta instância: os vilões se esquivam das sentenças dos tribunais aqui, na Terra, mas, depois da morte, serão condenados pelo STF do Céu.
Está certo, até podemos nos consolar com essa tardia justiça divina. Mas, na terrena, não é possível admitir tanto atraso. Que os maus sejam punidos depois da segunda condenação, no Brasil. Que o foro privilegiado seja extinto, e já. Que dinheiro, poder e popularidade não garantam impunidade. Se não estamos devidamente protegidos dos perigos sobre-humanos, que pelo menos possamos controlar e castigar os erros humanos. Isso nós podemos fazer. Isso o Brasil está fazendo. Aécio, Lula, Cunha e Odebrecht que o digam. Temer, pode esperar: a sua hora vai chegar. Salve os novos tempos da Lava-Jato!