Estava vendo fotos do desfile da Victoria's Secret que aconteceu em Xangai. As "angels". Como é bacana aquilo. Elas serpenteiam pela passarela em cima de botas de cano e salto altíssimos, vestidas só de biquíni, ornamentadas por grandes esplendores de penas, como vaidosas caudas de pavão.
Houve tempo em que sonhei com um mundo em que todas as mulheres se vestissem daquele jeito. Não importaria a forma física delas, não importaria sua idade, não importaria se fossem gordas ou magras, se usassem a faixa de presidente da República, limpassem as ruas como garis, assinassem receitas como médicas ou cuidassem dos filhos como donas de casa. Não importaria nada disso: todas as mulheres usariam aquelas roupas. A Renata Vasconcellos apresentaria o Jornal Nacional na frente de um esplendor de penas. Seria um mundo mais leve, mais amistoso.
Mulheres, sejam condescendentes conosco. Perdoem nossas tolices. No fundo, somos apenas guris.
Mas o mundo não é assim. Paciência. As mulheres vestem tailleurs e usam coque e, se alguma quiser ir ao trabalho de biquíni e salto alto, será criticada pelas redes. Malditas redes repressoras. Libertem as mulheres! Deixem que elas sejam angels! Que revelem o segredo de Victoria!
Gosto deste nome, O Segredo de Victoria. Li que o americano que fundou a marca, um sujeito chamado Raymond, o fez porque sentia vergonha de comprar calcinha e sutiã para a mulher dele em grandes lojas de departamento. Ele entrava em uma Mesbla, por exemplo, ia à seção de lingeries e os outros homens, que estavam escolhendo gravatas e chapéus, olhavam e saíam comentando:
– Vi o Raymond comprando uma calcinha.
Aí ele pediu dinheiro emprestado e inventou uma loja que só vendia calcinha e sutiã e, assim, pôde comprar presentes descansado para sua mulher. Mas, por algum motivo, a loja não deu certo nas mãos dele, Raymond acabou por vender a marca, e o novo dono, aí sim, transformou-a em sucesso e ficou bilionário. Raymond, que, está provado, era uma pessoa sensível, não suportou ver o outro ficar rico e famoso com sua criação e se matou, atirando-se do alto da ponte Golden Gate, em São Francisco.
Há várias intrigantes questões psicológicas nessa história. Uma delas é a relação de Raymond com roupas íntimas de mulher. Ele certamente sentia prazer ao escolhê-las, e por isso ficava intimidado ao ser observado por homens que não estavam fazendo o mesmo.
Lembro de uma entrevista que a loira Scarlett Johansson deu a uma emissora de TV sobre seu personagem no cinema, a Viúva Negra. Nos filmes, ela veste uma roupa colante preta. O entrevistador perguntou se ela usava alguma coisa debaixo do uniforme. Scarlett protestou:
– É o quinto homem que me pergunta isso! O que é que há com vocês???
Scarlett esperava que lhe perguntassem sobre suas técnicas de atuação, sobre suas ideias, sobre sua filosofia de vida, mas os entrevistadores só queriam saber se ela estava sem calcinha. Esse mero pensamento os perturbava.
Isso demonstra como nós homens somos bobos. Já disse e repito: as mulheres evoluem a vida inteira, nós só evoluímos até os 12 anos de idade. Para sempre seremos o que fomos aos 12 anos, com algumas responsabilidades a mais. Só os chatos se tornam realmente maduros. Portanto, mulheres, sejam condescendentes conosco. Perdoem nossas tolices. No fundo, mentalmente, ainda estamos jogando bolinha de gude com os amigos. No fundo, somos apenas guris. Este não é o segredo das Victorias. Este é o segredo dos Raymonds.