Há alguns anos, um dos editores da Zero Hora me procurou e propôs:
– Que tu achas de escrever sobre o cercamento da Redenção?
– Tudo bem – respondi. – Contra ou a favor?
Claro que era brincadeira, até porque eu sabia que ele queria que escrevesse CONTRA o cercamento. A ideia era fazer um contraponto com o Sant'Ana, que se empenhava em campanhas a favor de fechar o parque, e fomentar o debate no jornal.
Mas, mesmo brincando, eu não exagerava. Podia tecer argumentos contra ou a favor do fechamento da Redenção com idêntica ênfase, porque via pontos positivos e negativos nas duas posições.
Contei essa história no Conexão GaúchaZH, programa de debates que fazemos ao meio-dia das terças-feiras no Facebook. O fechamento da Redenção está de novo em pauta, por causa daquele terrível caso de estupro ocorrido no parque, dias atrás.
Essa questão da segurança me faz pender para o fechamento, mas, depois do programa, a Marcinha, que é arquiteta, ponderou:
– Imagina quanto custaria colocar grades em volta de todo aquele parque... Imagina o tipo de grades que eles colocariam... Imagina quantos portões o parque teria de ter e o trabalho que daria para abrir e fechar esses portões todos os dias, nos mesmos horários...
Como é possível, então, posicionar-se de um lado ou de outro sem ressalvas?
Depois de ter pingado todas essas reticências, concluí que ela estava certa e eu errado e fiquei contra o cercamento da Redenção.
Isso acontece comigo em relação a inúmeros assuntos. Às vezes, inclusive, escrevo contra algo e, mais tarde, escrevo a favor. Mas posso voltar a escrever contra. E outra vez ser a favor.
Você dirá que não tenho personalidade, mas, em minha defesa, observarei que, em geral, as questões humanas são bastante complexas e podem mudar de acordo com as circunstâncias. Tome por exemplo o debate mais candente da atualidade: liberais versus socialistas, a versão nova de capitalismo versus comunismo.
Se você estudar a história do mundo, constatará que nunca existiu capitalismo perfeito nem comunismo perfeito. Nas nações em que a população desfruta de mais liberdade e bem-estar, as forças do mercado e do Estado oscilam num sistema de pesos e contrapesos que funciona segundo as contingências. Ora o mercado tem mais abertura, ora o Estado tem mais controle.
No Brasil, país de tantas carências sociais, é evidente que o Estado tem de dar algumas garantias. Só que, no momento, está provado que o Estado se excedeu, está sufocando o mercado e prejudicando quem deveria proteger. Logo, é preciso conter um pouco o Estado e dar mais corda ao mercado. Mas isso, sem dúvida, pode mudar. Talvez seja até inevitável que mude.
Como é possível, então, posicionar-se de um lado ou de outro sem ressalvas? Como é possível julgar (e condenar) as pessoas por suas opiniões, e não por seus atos?
Sou contra isso.
Pelo menos por enquanto.