Carregar as cadeirinhas para a beira da praia é algo que todos fazemos sem pensar que o alumínio é o material cuja produção em massa mais cresce no mundo. O alumínio é essencial para o desenho de veículos leves, contêineres de armazenamento, sem falar na engenharia civil. Sua síntese é baseada no refinamento da bauxita, uma mistura de minerais. O resíduo desse processo, conhecido como lama vermelha, é altamente alcalino, contendo uma série de metais pesados, como cadmio.
Atualmente, existem 4 bilhões de toneladas dessa lama tóxica, que normalmente é colocada em buracos gigantes, criando lagos vermelhos, verdadeiras catástrofes esperando para acontecer – quando já não estão contaminando seus arredores naturalmente. A cor vermelha, como no nosso sangue, é dada pelo alto conteúdo de ferro – 70% do peso bruto desse resíduo. A purificação do ferro dessa lama não é feita devido ao alto custo, considerado inaceitável por companhias mineradoras.
Nesta semana, a revista Nature publicou um artigo de um engenheiro brasileiro, radicado no Exterior, sobre um processo barato e verde – ecológico – de extração de ferro desse tipo de rejeito. O grupo de Isnaldi Souza Filho havia observado que era possível usar hidrogênio ionizado (com carga elétrica) para remover o oxigênio do ferro – algo que poderia ser utilizado para fazer aço. Com um forno elétrico para aumentar a temperatura, eles utilizaram o mesmo processo para tratar a lama vermelha, e, em 10 minutos, conseguiram bolinhas de ferro puro. O restante dos metais ficava em pH neutro – podendo ser reaproveitados para fazer concreto.
Se toda a lama vermelha que existe puder ser tratada dessa forma, em nível industrial, essa seria uma maneira ecológica de produzir aço. Se a indústria puder utilizar energia renovável, o impacto de emissão de carbono é minúsculo. Uma promessa que os cientistas do grupo estão motivados a cumprir. Há muito trabalho pela frente, ainda. Como escalonar o processo. Como armazenar a lama vermelha em uma indústria. Como converter o que existe de forma a adaptar o processo.
Veja bem, uma composição semelhante tinha a lama das tragédias de Brumadinho e Mariana. Eu não conheço pessoalmente o Isnaldi, e o trabalho dele parece ter sempre sido consistente na busca de soluções sustentáveis para a produção de materiais. Como ele, muitos outros cientistas brasileiros estão hoje radicados no Exterior. Se o país tivesse uma política de repatriar essas pessoas brilhantes, com um salário decente e verba para a pesquisa, quantas outras tragédias poderiam ser evitadas, quantas ideias geniais emergiriam continuamente daqui?
Essas iniciativas não podem ser deixadas para depois. Precisamos ter políticas públicas sólidas de repatriar cientistas e garantir soluções verdes para ao menos amenizar o impacto que as hoje inevitáveis mudanças climáticas já têm na nossa vida. Chega de brincar de gestão, de polarizar público ou privado, e vamos falar sério em investir no presente, para o futuro não ser às escuras – como experimentamos nesses dias em um totalmente despreparado Rio Grande.