Quem dobra uma esquina e topa com o centro cultural The Shed (algo como "o barracão"), em Manhattan, é atravessado por uma repentina vertigem de futuro. Da cobertura que lembra uma enorme colcha de matelassê metalizada à gigantesca estrutura móvel (uma espécie de puxadinho high-tech que se desloca sobre trilhos, reduzindo ou ampliando o espaço interno conforme a necessidade), tudo no prédio inaugurado em 2019, ao lado da High Line, parece saído das páginas de um gibi de ficção científica.
Pois eis que desse objeto-sim resplandecente, no coração do Hemisfério Norte, um índio desceu de uma estrela colorida, brilhante. A exposição A Luta Yanomami, em cartaz até o dia 16 de abril, instalou a preocupação com o futuro em um espaço que parece proclamar o triunfo do progresso em cada milímetro de sua superfície prateada. Soa como um paradoxo, mas faz todo sentido. Sem índios não há floresta, e sem floresta não há garantias de que o planeta vai permanecer um lugar muito agradável para se viver nos próximos anos — mesmo se você tiver a sorte de nascer em um país com tecnologia e recursos suficientes para enfrentar emergências climáticas em série.
Dedicada à colaboração e à amizade entre a fotógrafa Claudia Andujar e o povo yanomami, a mostra chegou ampliada a Nova York, depois de passar por São Paulo, Rio de Janeiro, Paris e Londres, entre outras cidades. Fui visitar a exposição no dia em que foi aberta. Já havia ficado impressionada com a Galeria Claudia Andujar, em Inhotim, mas a mostra em cartaz no The Shed é ainda mais impactante. Não apenas porque o Brasil, a distância, parece doer mais, ou pelo fato de a inauguração em Nova York ter coincidido com a crise sanitária e a operação de resgate que está em curso em Roraima, mas pelo caráter de urgência que a curadoria conseguiu imprimir ao conjunto das obras — além das fotografias de Andujar, gravuras e vídeos produzidos pelos próprios indígenas.
Claudia Andujar é uma artista sensível, mas é também uma ativista incansável que, aos 91 anos, continua trabalhando pela causa yanomami. A mostra reflete essa dualidade. Ao mesmo tempo em que somos capturados pela delicadeza dos retratos, pela ousadia no uso da luz e pela beleza etérea da floresta, somos convidados a conhecer uma luta que se estende há pelo menos 50 anos — primeiro pela demarcação de terras, formalizada em 1992, agora pelo respeito à lei.
A Luta Yanomami é um documento, uma experiência estética e um pedido de ajuda. O que está em risco não é apenas a sobrevivência de um povo ou do seu precioso hábitat, mas uma visão de mundo — traduzida em imagens por Claudia Andujar e em versos por Caetano Veloso: "E aquilo que nesse momento se revelará aos povos / Surpreenderá a todos não por ser exótico / Mas pelo fato de poder ter sempre estado oculto / Quando terá sido o óbvio".