A primeira e única vez em que pisei em um cinema pornô, eu tinha mais de 25 anos e estava a trabalho. A experiência foi rápida, porém marcante. Minha missão era avaliar todos os 36 cinemas de Porto Alegre em quesitos como som, projeção e limpeza – inclusive Lido e Carlos Gomes, as duas salas da cidade especializadas em "cinema adulto" no início dos anos 1990.
Nos 15 minutos em que permaneci em cada uma das salas – sob o olhar curioso dos poucos (e agitados) espectadores presentes – vi coisas, digamos, impactantes acontecendo na tela. Lembro que oficiais nazistas com luvas de vinil até os cotovelos faziam parte da trama em exibição no Lido. E não me perguntem mais.
Para consumidores diligentes de pornografia, já existiam naquela época as prateleiras do fundão das videolocadoras – o que era bem mais acessível do que os cinemas de calçada do centro de Porto Alegre, mas ainda exigia uma certa logística. No caso dos adolescentes, além da grana para a locação, era preciso burlar o cartaz "proibido para menores".
Tudo isso soa agora incrivelmente low tech. Nos dias de hoje, os sites de pornografia gratuita saltam no colo, literalmente, de qualquer garoto interessado – dos oito aos 80 anos. É possível que um colega mostre a outro, no celular, durante o recreio da escola. Ou que uma pesquisa sobre um tema qualquer no Google acabe conduzindo, por acaso, a uma imagem tão ou mais desconcertante do que a do oficial nazista do cinema Lido.
O fato é que crianças e adolescentes estão consumindo pornografia cada vez mais cedo – a média de idade gira entre 13 (meninos) e 14 anos (meninas). Os pais, em geral, não sabem. E, quando sabem, preferem não falar a respeito.
Trata-se de um fenômeno muito recente e pouco estudado para que já se saiba como o consumo precoce de pornografia anda afetando a forma como a geração nativa digital encara o prazer, a intimidade e as relações de poder entre os sexos.
O que se sabe é que o amigo, o irmão mais velho e o primo já não são as fontes primárias responsáveis por ampliar o vocabulário e o repertório de pirralhos curiosos. A educação sexual de garotos e garotas, na prática, está entregue a vídeos pornográficos que encenam todo tipo de fetiche – muitos deles disseminando imagens idealizadas do corpo e do desempenho sexual e banalizando a violência. As "fake news do sexo" acabam criando angústia e falsas expectativas nos adolescentes, com consequências tão imprevisíveis, neste momento, quanto as notícias falsas distribuídas nas redes sociais.
Na última quarta-feira (7/2), o jornal The New York Times publicou uma longa reportagem sobre o assunto, com o título "O que os adolescentes estão aprendendo com a pornografia online". Além de conversar com dezenas de garotos e garotas, a repórter Maggie Jones acompanhou, em Boston, as aulas de um curso de "alfabetização para a pornografia", iniciativa que visa a reduzir a violência sexual ajudando alunos do Ensino Médio a desenvolver uma visão crítica da indústria pornográfica, esclarecendo dúvidas e debatendo o assunto sem moralismo ou preconceito.
Como as "fake news", o "fake sex" pode ser menos inofensivo do que parece, e o antídoto para ambos é o mesmo: informação.