Rafael Borré já poderia ser o artilheiro do Brasileirão, mas ele não marcou nenhum gol.
Não somente no campeonato que parte para sua quarta rodada, mas também na Sul-Americana e na Copa do Brasil. Na verdade, não assinalou nenhum gol ainda pelo Inter. Nenhum gol no ano inteiro, sequer no alemão Werder Bremen, em que atuava antes.
Por enquanto, é um goleador espiritual.
Errou pênalti, em que isolou na arquibancada, errou frente a frente com goleiro, errou sem goleiro, cabeceou na trave, chutou na trave. O que já desperdiçou de oportunidades está numa escala sobrenatural.
Contra o Athletico Paranaense, tentou um arremate de segurança e deu chance para o zagueiro Thiago Heleno tirar. Realizou o oposto na penalidade em cima do Palmeiras, em que bateu com fúria de olhos fechados, e tampouco obteve êxito. Nem força, nem jeitinho funcionam.
É de se imaginar primeiramente que o Inter falhou na sua contratação milionária, no valor de 6,2 milhões de euros. Porém ele demonstra ser diferenciado mesmo. Não é possível pensar de modo limitado e tacanho. Não é um perna de pau. O jovem colombiano de 28 anos tem grife de seleção, com traquejo, técnica, posicionamento. Não fica trombando, não se confunde com os pés por afobação, não exibe tiques nervosos de impostor, não bate de canela ou de qualquer jeito, não se esquece de virar o pescoço e calibrar a testa.
Ele não desaprendeu a jogar. Parece um craque em abstinência, um craque em jejum, um craque numa fase maldita.
Perdeu por um momento a reciprocidade da bola.
Atacante tem disso: a bola deixa de gostar dele por um tempo. Ela não corresponde aos chamados, às carícias, aos pedidos desesperados para que se encaminhe às redes.
O incensado Pedro, matador do Flamengo, já amargou oito partidas sem gols — assim como no Fluminense aguentou um silêncio de sete partidas.
É como um relacionamento amoroso. A bola é a esposa de Borré e o tem obrigado a dormir no sofá. Não se separou dele, não houve divórcio, apenas está chateada com ele. Por algum motivo, não pintou aquele clima para o perdão e para a reconciliação.
Borré vive um bloqueio criativo, um carma de resultados, e precisamos ajudá-lo a merecer a sua cama de volta.
Quanto mais os colegas se compadecem dele e facilitam a sua finalização, mais ele se sente em dívida de gratidão. Quanto mais ele é substituído na secura, mais ele se sente inútil.
Um centroavante sem gols é um homem sem alma, sem paz de espírito, sem confiança.
Não devemos vaiá-lo, não devemos criticá-lo, por mais que um lance perdido signifique uma dolorosa e injusta derrota.
Quando um jogador de tarimba como ele se encontra em estado de provação, merece apoio para não se ver isolado, desprovido de amigos e de torcida.
Deve focar em jogar bem, mais nada. Que ele faça de conta que é um volante. Permanecer em cima do problema apenas gera neurose. A bola odeia quem corre atrás dela.
Não consigo ficar furioso com ele. Uma hora vai acontecer, uma hora vai desencantar, uma hora ele vai extrapolar a conta e encher a sacola.
Na quinta-feira (25), no embate decisivo com o Delfín, uma informação astrológica: acaba o Mercúrio retrógrado.
Esperaremos Borré fazendo continência.