É muito engraçado quando um amigo vira pai.
Ele fica monotemático. Só fala do filho.
Você diz “oi” e ele mostra a foto do seu nenê. Você diz “tudo bem” e ele apresenta outra foto do seu nenê. Vai tirando bebês como coelhos da cartola.
Qualquer saudação é pretexto para expor a pastinha de imagens de seu celular.
“Olha meu filho comendo sopa.”
“Olha meu filhinho comendo papinha de cenoura.”
“Olha meu filho comendo papinha de maçã.”
Quem observa de fora da relação não vê nenhuma diferença, a não ser a cor da comida.
Mas, para o pai de primeira viagem, tudo é inédito e maravilhoso. Tudo é raro. Tudo é um milagre.
Não tem como se desvencilhar da palestra e do PowerPoint. É muito pior do que mãe apresentando o álbum familiar para o genro ou a nora no sofá.
O pai de primeira viagem entra num transe enquanto passa o dedo para o lado na tela. Parece que ele mesmo nunca tinha visto aquelas cenas. Fica mais surpreso do que seu interlocutor.
“Meu filho no parto.”
“Meu filho no primeiro dia.”
“Meu filho no segundo dia.”
“Meu filho no terceiro dia.”
Reze para que o filho não tenha dois anos, senão será uma maratona. Consumirá duas horas de pé analisando roupinhas, brincadeiras, risadas, caretas.
Você somente queria parabenizar o amigo pela paternidade, e recebe um dossiê. Ele nem se dá conta do quanto se tornou antissocial. Não pergunta nada de você, do que está fazendo, por onde anda: unicamente discorre sobre seu rebento.
Não tem olhos para mais nada. Já nem usa dinheiro — sua moeda é leite em pó, fraldas, pomadinha de assadura, lenço umedecido. Seu orçamento é feito por essa particular criptomoeda em farmácias e supermercados.
O segundo filho até melhora os sintomas, controla a incontinência verbal, suaviza a catarse, mas o pai jamais encontrará cura para tanto amor dentro de si.
Sem que você pergunte qualquer coisa, ele ministra uma aula de como segura o filhinho para combater as cólicas e remediar o choro da insônia.
Antes o amigo comentava sobre o seu time de futebol, sua performance no emprego, seus negócios, suas viagens. Hoje exclusivamente narra o que o seu filho fez ou deixou de fazer. Repete histórias. Busca exibir semelhanças físicas com o pequeno. Ainda que seja o jeito de bocejar.
Se sua criança não é nem um pouco a sua cópia na aparência, recorre ao argumento de que ela tem a sua personalidade.
Todo bebê modifica o DNA do homem. Escancara a sua alma. Faz com que seja terrivelmente romântico, derramado, sentimental, piegas.
O sujeito se torna automaticamente um babão. Guardanapo não é suficiente, precisa de um babador.
O segundo filho até melhora os sintomas, controla a incontinência verbal, suaviza a catarse, mas o pai jamais encontrará cura para tanto amor dentro de si.