Sessenta anos parecem tão pouco para uma vida. David Coimbra morreu jovem. Alguém como ele deveria viver 100 anos, pelo nosso egoísmo de lê-lo, de ouvir as suas reflexões, de ver como ele comparava o momento presente com os ciclos da história. Era um historiador disfarçado, um escritor apaixonado, um polemista involuntário, um cronista dos prazeres do cotidiano.
Aquela última página do jornal Zero Hora fica órfã de novo. Paulo Sant'anna e Carlos Nobre morrem com David Coimbra.
É o mesmo desamparo bíblico. Nunca estamos preparados para o baque, mesmo sabendo que ele lutava contra o câncer há uma década. É um adeus inédito, violento, como se fosse um acidente. Amar é sempre perder a pessoa inesperadamente. Ela pode estar na cama de um hospital, com as semanas contadas; ainda assim é uma fatalidade.
A morte só é morte depois dela. Não existe ensaio. Nenhuma fantasia nos prepara para a realidade amarga da despedida. O último suspiro é um furacão levando os telhados dos familiares e dos amigos.
David veio a falecer no aniversário de 83 anos de minha mãe, neste 27 de maio. Eu empresto o nascimento da minha mãe para dar colo à sua partida, David. Você que foi maiúsculo com a doença mesmo agarrado a uma esperança minúscula de recuperação, que pedia apenas um dia sem dor, que entendia que a felicidade era não temer mais o próprio corpo.
Rio Grande do Sul terá um vazio daqui para frente. Vou olhar mais para o chão do coração, para não cair em pranto pela milonga irremediável de seu nome.
Você transformou sessenta anos em séculos. Não foi pouco. Deixou muito para nós. Obrigado.