Peço licença para tratar de um assunto delicado, mas de alto interesse: suicídio, tentativas de suicídio e automutilação de adolescentes.
O ponto de partida desta conversa é uma reportagem de cinco páginas, no caderno DOC, que revela uma pesquisa inédita nas 2,5 mil escolas estaduais do Rio Grande do Sul.
Das 1.622 instituições que responderam ao formulário enviado pela Secretaria da Educação, 357 relataram 1.015 situações de automutilação, 101 confirmaram 169 tentativas de suicídio e seis informaram casos de suicídio consumado no primeiro semestre de 2018. O levantamento foi realizado pela Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e Violência Escolar (Cipave).
Para apresentar a pesquisa, destacamos uma das mais talentosas repórteres de ZH. Aos 40 anos, Aline Custódio consolidou sua carreira contando dramas e realizações de moradores da periferia de Porto Alegre, nos 10 anos em que trabalhou no Diário Gaúcho, e do Rio, nos dois anos em que foi repórter do jornal Extra (das organizações Globo). Mas poucas pautas tocaram tanto Aline quanto a apuração que resultou na reportagem "O grupo da escola me salvou".
– Não sou mãe, mas sou tia e dinda e acabei a matéria com a certeza de que precisamos estar mais próximos dos adolescentes. Fiquei surpresa de como eles se sentem sozinhos – diz Aline, após conversar com alunos, professores e especialistas.
Embora pesado, o texto de Aline foca na esperança. Entre as histórias narradas, há a de uma adolescente de 16 anos, moradora de Capão da Canoa, que reencontrou o sentido da vida conversando sobre suas angústias com colegas da escola Luiz Moschetti. Cada encontro, supervisionado pelas professoras Maribel Cherutti e Fabíola Silveira, começa com a mesma pergunta: como foi a tua semana?
– O resultado é que temos recebido relatos lindos de reencontros entre mães, pais e filhos – diz Fabíola.
Reportagens sobre suicídio são tratadas com cautela em ZH. Sempre que nos aprofundamos no tema procuramos abordá-lo como problema de saúde pública e na perspectiva de oferecer um serviço para quem precisa de ajuda. Em julho de 2006, coube a mim a responsabilidade de contar os bastidores do suicídio de um adolescente de 16 anos, na Capital. Era o primeiro caso de que se tinha notícia no Brasil – e um dos raros no mundo até aquele momento – de uma morte incentivada e acompanhada, em tempo real, pela internet. Mergulhei na história de Yoñlu (como ele preferia ser chamado), nos seus dramas e na sua busca por socorro. Como um menino genial, que, soube-se depois, deixara um legado musical de qualidade e cuja breve trajetória seria contada em filme que está em cartaz na Capital, decidira acabar com a própria vida? Mas descobri que o desfecho encontrado por Yoñlu estava longe de ser algo isolado. O Rio Grande do Sul é o Estado com o maior índice de suicídios (11 casos por 100 mil, o dobro da média nacional). A história motivou, dois anos depois, a reportagem "Tragédia silenciosa", mencionada pela Associação Brasileira de Psiquiatria como referência na abordagem do assunto.
Talvez o estudo da Secretaria da Educação e exemplos como o da escola Luiz Moschetti estimulem políticas de prevenção no Estado.