Ouvia na rádio Gaúcha a mãe do João, de 17 anos, sobrevivente do acidente que matou nove pessoas no Paraná na semana que passou. João Pedro Milgarejo estava dormindo no momento do acidente e não teve lesões graves. Ao tentar sair da van, notou que ninguém respondia seu pedido de ajuda. Naquele momento ele entendeu a gravidade do que acontecera.
Graciele Nolasco não tem como não estar feliz de ver seu filho vivo. Ele não ter morrido é um milagre, ela mesma disse. Graciele, ao mesmo tempo, não tem como não estar arrasada com a perda dos melhores amigos do João. Ela também disse nessa entrevista ao repórter Frederico Feijó, no Timeline, que sente a dor dos outros pais e mães e que eles se consideram família uns dos outros. Velar e enterrar um filho não é a ordem natural da vida, mas quem sabe explicar o mistério de viver e de morrer?
Essas famílias se preparavam para receber seus filhos e suas sete medalhas, conquistadas no campeonato em São Paulo. Na terça-feira (22), precisaram fazer, como se fosse um soco no estômago, um velório coletivo. Essa é uma dor que podemos tentar imaginar, mas somente eles vão sentir, para sempre. O vazio dos sonhos de adolescentes que queriam competir no remo e se tornar alguém na vida. A lacuna deixada por vidas interrompidas numa fatalidade no trânsito. Mais do que os nove, morrem um pouco seus familiares e amigos. Morrem um pouco as mães, que sentem junto e inevitavelmente se colocam no lugar das que perderam seus maiores amores.
A Angel Vidal faria 17 anos em duas semanas. A Helen Belony, de 20 anos, era uma promessa do remo nacional. O Henri Guimarães, aos 17 anos, mais do que praticar, acreditava no esporte como ferramenta social para jovens como ele. O João Pedro Kerchiner da Silva, também tinha 17 anos e ganhou o ouro com os colegas no sábado passado. A Nicole da Cruz tinha só 15 anos, assim como o Samuel Benites Lopes. Os caçulas da viagem tratavam o esporte como coisa muito séria. Vitor Fernandes Camargo, de 17 anos, dizia que o remo lhe dava motivação para acordar cedo e dar o seu melhor. O treinador, Oguener Tissot, de 43 anos, respirava, comia e dormia pensando no remo. O Ricardo Leal da Cunha, 52 anos, era o motorista da viagem. São nove famílias. É uma comunidade inteira.
As circunstâncias nada têm a ver com a Kiss, mas mais uma vez lembramos, por falar de jovens, do que aconteceu naquela madrugada em Santa Maria. Uma ferida que continua aberta e que só o tempo ajuda a cicatrizar e seguir em frente. Pelotas precisará seguir em frente. O Remar para o Futuro terá, mais do que nunca, que olhar para o horizonte e encontrar formas de seguir e de continuar ajudando jovens de escolas públicas. A dor continuará, o trauma estará presente, mas o legado do esporte como alternativa precisará prevalecer.