— Um pacotinho daqueles que vem três pares de meias brancas — respondeu meu pai quando perguntei o que ele queria de presente pelo dia dele.
— Só isso, pai?
— Só.
Ele só queria isso mesmo. Além da presença, claro. Almoçamos juntos no domingo a comida preferida dele e, entre um pedaço de carne malpassada e um gole de cerveja gelada, ficamos ali refletindo sobre a beleza da simplicidade. Não é preciso muito para ser feliz, mas o essencial não pode faltar: a saúde. E naquela conversa havia experiência no tema. Minha e dele.
Recentemente, Seu Edmundo teve uma alteração percebida pelo cardiologista em um raio-x do tórax que fez como revisão depois de ter contraído a covid-19. A orientação era fazer um cateterismo "apenas por precaução", explicou o Dr Guilherme Teló.
É um exame invasivo que demanda certos cuidados, mas o tempo de espera e a expressão fechada no rosto do médico que caminhava em direção à minha mãe no corredor do hospital, depois da realização, diziam que havia mais. Ela conta que, por alguns instantes, chegou a imaginar como dividiria com os filhos a notícia da perda precoce do marido.
Não pensou na dor dela, já imaginou como seria para os filhos. Essas mães, sempre colocando tudo na frente delas mesmas. Mas, voltando, aqui o tema são os pais. Um pai, especificamente, e sua história, que, espero, possa servir de alerta para outros.
Algumas artérias dele estavam bem "entupidas", e, mesmo que os testes ergométricos, na esteira, estivessem normais, o cateterismo revelou um comprometimento que demandava nossa atenção. Foi preciso colocar alguns stents. Estava longe de ser o fim da vida dele, mas seria preciso encarar a urgência de uma mudança da vida atual.
As semanas subsequentes ao procedimento foram exemplares. Mesmo que meio disfarçados em um suflê ou uma tortinha, os legumes começaram a estar mais presentes e aquele saladão, com tudo picado, pintava na mesa dia sim e dia também. As caminhadas diárias recomendadas eram seguidas à risca.
Mas o tempo foi passando e os hábitos antigos foram voltando. A única salada que entra no prato hoje voltou a ser a de batatas com maionese, a preguiça tem vencido a queda de braço sobre a caminhada nas manhãs. E o que era uma condição para continuar vivo, passou a ser mais uma das tantas demandas que deveriam ser prioridade, mas acabam ficando de lado.
É difícil mudar para um estilo de vida mais saudável e ainda mais difícil mantê-lo. Penso que o maior dos estímulos é tentar não responder o motivo de não estarmos fazendo, mas por quem. Durante o tratamento para o câncer de mama eu queria estar curada pelo meu filho, pelos meus pais, muito mais do que por mim mesma. Esse desejo foi minha força na doença, e vem sendo minha força na saúde. E tu? Quem é que te faz desejar estar bem, estar vivo? Responde também, pai. Eu sei que tu tá lendo a coluna.
Como complemento ao presente de dia dos pais, comprei uma camiseta dessas de fazer ginástica. Escolhi um modelo que tinha uma frase, em inglês (e um dia eu vou entender por que colocam essas frases motivacionais - e tantas outras coisas por aí - em inglês): "it never get’s easier, is you that get stronger". Nunca fica mais fácil, você é que fica mais forte.
Vale para o meu pai e para todo mundo que está esperando algum milagre para começar a cuidar mais da saúde. Não, não é fácil. Sim, precisamos nos auto-desafiar todos os dias.
Mas vale a pena. Vale continuar vivendo a vida em toda a sua simplicidade. Boa e simples como um pacote de meias brancas, que eu espero que nesse momento estejam dentro de um tênis sendo utilizadas em uma bela caminhada.