Está prevista para a próxima quinta-feira (17) uma reunião proposta pela Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul) para tentar encaminhar acordo que sele uma trégua entre produtores de soja e de culturas como oliveiras e videiras – envolvidos em conflito pela deriva do agroquímico 2,4-D.
O herbicida, aplicado antes do plantio do grão para eliminar a erva daninha buva, se espalhou pelo ar provavelmente pela má aplicação e atingiu parreirais e olivais – causando prejuízos milionários e perdas de até 40% nessas produções na Campanha. Na última terça-feira (8), a Secretaria da Agricultura entregou ao Ministério Público Estadual (MP) relatório com 79 laudos laboratoriais e 69 confirmações de resíduos do 2,4-D em outras culturas – como uva, oliveira, maçã e milho.
O produto hormonal ataca o desenvolvimento dos vegetais. As demonstrações científicas levaram o caso do terreno da suposição para o da certeza. O problema é real e, agora, as entidades sentarão à mesa para buscar acordo. A Farsul está convidando para o encontro representantes dos sojicultores e de produtores das culturas mais atingidas. Também estão sendo chamados dirigentes do Ministério da Agricultura, além de técnicos da secretaria estadual. O MP, que apura o caso da deriva do 2,4-D por meio de inquérito aberto ainda em 2015, é outro convidado para a mesa de negociações.
– A ideia é que juntos possamos discutir caminhos para que o problema diagnosticado não continue a acontecer. Precisamos de solução que não resolva só a questão do 2,4-D, mas que sirva como modelo, nos ajudando a lidar com situações semelhantes no futuro. Não podemos viver de surtos – diz Eduardo Condorelli, superintendente do Senar-RS, braço de tecnologia e capacitação técnica da Farsul.
REGULAMENTAÇÃO DA PULVERIZAÇÃO TERRESTRE
Entre os itens que devem surgir no debate, um dos que apresentam potencial para representar solução mais próxima do consenso é a regulamentação da pulverização terrestre, método utilizado para lançar químicos na lavoura. Atualmente, não existe nenhuma regra oficial sobre como utilizar os produtos corretamente.
Em caso de regulamentação, a ser feita pela Agricultura, seriam definidos itens como as condições climáticas em que se permitiria a aplicação, desde a temperatura até velocidade do vento. A promotora Anelise Grehs, responsável pelo inquérito que corre no MP, trabalha com todas as alternativas (leia mais abaixo), mas não descarta requerer judicialmente a suspensão do uso do 2,4-D no Estado.
A hipótese é refutada pelos sojicultores, que apontam a eficiência do produto e o custo mais baixo em comparação com outros herbicidas. Retirá-lo do mercado, dizem, aumentaria despesas e reduziria a competitividade da soja gaúcha, principal produto de exportação do agronegócio.
– O problema não é o produto, mas a forma de aplicação. Terminar com o 2,4-D não é a solução. É um problema que pode ocorrer com outros defensivos – diz Luis Fernando Fucks, presidente da Associação dos Produtores de Soja do Estado (Aprosoja).
Ele defende a “profissionalização” dos processos de aplicação por meio da intensificação de programas de treinamento como o Deriva Zero, da Farsul. Fucks ainda destaca que solicitou à Embrapa uma lista com referências de adjuvantes (óleos minerais) que, ao serem misturados ao 2,4-D, aumentam o peso da gota, evitam o fracionamento e reduzem as chances de deriva.
Possíveis caminhos
Regulamentação da pulverização terrestre
Hoje, não existem regras oficiais sobre como usar agroquímicos corretamente na pulverização terrestre. Além de definir condições climáticas de aplicação, seriam apontadas as características dos bicos dos pulverizadores e a densidade da gota – quanto mais pesada ela for, menor a chance de deriva. Ainda seriam previstas penalidades para quem for descoberto em desconformidade.
Zoneamento e áreas de exclusão
Delimitação de espaços geográficos onde o 2,4-D não poderia ser aplicado. Nos bastidores, essas hipóteses não encontram consenso pela dificuldade de fiscalização e pelo grau de restrição: ao criar uma área de exclusão de 15 quilômetros na Campanha, por exemplo, mais de 11 mil imóveis rurais seriam atingidos, segundo a Fepam.
Programas de treinamento
Intensificação de programas de capacitação dos produtores para melhorar a aplicação do agroquímico, como o Deriva Zero, da Farsul.
Proibição temporária
A suspensão do uso do produto não é descartada pelo MP.