As mais pessimistas estimativas para a safra de trigo vêm sendo confirmadas a cada nova divulgação de balanço de colheita. As perdas avaliadas em cerca de 50% sobre o inicialmente previsto, de acordo com Hamilton Jardim, presidente da Comissão de Trigo do Sistema Farsul, resultam em um prejuízo próximo a R$ 1,2 bilhão.
Da colheita estimada pela Farsul de cerca de 2,7 milhões de toneladas, o número deve ficar próximo a 1,5 milhão, segundo cálculos da Conab, que aponta uma colheita de 1.731 quilos por hectare. O problema é que grande parte do que foi colhido apresenta uma baixa qualidade - destinado à ração animal ou exportações. E é nos embarques a outros países que deve ficar a maior parte do volume colhido - em torno de 1,1 milhão de toneladas, de acordo com Andreas Elter, presidente do Sindicato da Indústria do Trigo no Estado do Rio Grande do Sul (Sinditrigo-RS).
Para compensar os gastos com tecnologias e insumos que exigem investimentos intensivos, o trigo necessita de uma produtividade entre 55 a 60 sacas por hectare. Jardim destaca neste ano que o rendimento está muito abaixo dos custos, reforçando as perdas.
Para o trigo de melhor qualidade, os preços neste ano ficaram acima de 2014. Enquanto em 2015 o preço médio praticado em novembro foi de R$ 629,61 a tonelada do Tipo 1 (para pão), no mesmo mês do ano passado foi de R$ 489,74, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da USP (Esalq/USP).
- É necessária a adoção urgente de uma política pública para uma cultura tão importante. O Brasil não é autossuficiente justamente por não estimular a produção, com seguro efetivo e mecanismos de preços mínimos - considera Hamilton Jardim, da Farsul.
A euforia da super safra de 2013, que resultou em uma colheita de 3,35 milhões de toneladas, foi substituída pela apreensão e surpresa pelos dois anos de resultados negativos em função do El Niño. Enquanto 2014 trouxe giberela pelo excesso de chuvas, neste ano geada e precipitações em excesso prejudicaram a quantidade e a qualidade do produto.
No Estado, o consumo anual de trigo para moagem fica próximo a 1 milhão de toneladas. Em 2014, foram processadas cerca de 1,7 milhão de toneladas. As 700 mil toneladas excedentes foram vendidas a outros Estados.
- A produção deve cair pelo menos 200 mil toneladas, perdemos competitividade para vendermos para a Região Sudeste - diz Elter.
Prejuízos provocados por temporais nas lavouras chega a R$ 700 milhões
Preço da farinha de trigo disparou e seguirá em alta
A redução pela metade da estimativa de colheita de trigo impactou nos preços de toda a cadeia produtiva. Em seis meses, a saca de 60 quilos da farinha de trigo passou de R$ 34 para R$ 44. E mais aumentos vêm por aí. Segundo o Sindicato da Indústria do Trigo no Estado do Rio Grande do Sul (Sinditrigo-RS), até março serão mais 10%, resultado da recomposição de margens e do repasse dos custos de matéria-prima, insumos e frete.
- O Rio Grande do Sul vive uma situação diferente dos demais Estados, está em um maior ritmo de negociações pela necessidade em garantir trigo de qualidade - detalha Rafaela Moretti, analista de mercado do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada, da Universidade de São Paulo (Esalq/USP).
Gerson Pretto, proprietário do Moinho Estrela, de Canoas, ressalta que o ideal seria ampliar os estoques, mas o espaço é limitado. Atualmente, a empresa tem capacidade para armazenar trigo para um mês e meio de produção.
A realidade é melhor do que grande parte dos moinhos, que têm áreas mais restritas.
- Há um limitador de caixa e de estoque na indústria - reforça Andreas Elter, presidente do Sinditrigo-RS, explicando que é inviável adquirir trigo para um período de 10 meses, prazo em que começaria uma nova safra.
Outra dificuldade do setor é o fator logístico. Em fevereiro, começa o escoamento do milho e, na sequência, da soja, o que eleva os preços do frete e reduz o número de caminhões disponíveis.
- Não teremos trigo suficiente até setembro de 2016, quando começa a colheita no Paraná e no Paraguai - alerta Elter.
Para driblar a escassez do cereal, os moinhos estão ampliando as compras do Paraná, onde 80% da lavoura foi de qualidade, e importando de países do Mercosul, principalmente Argentina, Paraguai e Uruguai. Hoje, o preço do trigo importado está em torno de R$ 900 a tonelada, contra R$ 650 e R$ 850 do produto local, dependendo da variedade e da qualidade do cereal.