Quando lançaram ao solo as primeiras maradonas, nome dado às sementes de soja transgênicas que começaram a entrar por contrabando pela Argentina, em 1998, os gaúchos abriram caminho para o que se transformaria em uma revolução na agricultura do Brasil. Protagonista da polêmica que foi parar na Justiça, o Estado alcançou adesão quase plena aos transgênicos: hoje, 99% das lavouras de soja são cultivadas com sementes modificadas. No país, 10 anos após a legalização da venda, 92,4% das lavouras são plantadas com essa tecnologia.
- Foi uma batalha, e o Rio Grande do Sul foi herói, inclusive com produtores presos - recorda Glauber Silveira, presidente da Aprosoja.
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A resistência aos transgênicos vinha de ambientalistas, movimentos sociais e consumidores receosos quanto aos efeitos da biotecnologia. Mas a desconfiança não impediu que as sementes modificadas dominassem as lavouras.
- A questão era ideológica. Até hoje, não se comprovou que os transgênicos tenham causado danos à saúde humana ou animal - diz o chefe-geral da Embrapa Soja, Alexandre Cattelan.
No campo, os benefícios propagados vão da melhoria no manejo ao melhor uso de máquinas e mão de obra.
- A transgenia mudou a vida do agricultor, desde a simplificação de processos até o controle eficiente das plantas daninhas. Podemos compará-la à revolução verde - diz Narciso Barison, presidente da Associação Brasileira de Sementes e Mudas (Abrasem).
Em 10 anos, a multinacional Monsanto reinou isolada no mercado de soja transgênica, com a tecnologia RR1. Neste ano, a nova geração, a Intacta RR2, entra no mercado. Marcelo Gatti, gerente de marketing de soja da empresa, diz que a próxima safra terá 38 variedades da Intacta, devendo abranger 2,5 milhões de hectares - cerca de 7% da soja cultivada no país.
Apesar do rápido avanço dos transgênicos, há ainda divergências quanto aos benefícios. Professor do Instituto de Biociências da UFRGS, Paulo Brack, alerta que o uso de agrotóxicos cresceu mais de 70%, enquanto a área plantada, 60%, entre 2002 e 2011. Para ele, a escassez de sementes convencionais é considerada "gravíssima" por tirar o direito de escolha do agricultor.
- O agricultor não pode ficar refém de um pacote tecnológico (sementes e defensivos) oferecido por empresas.
Uma escolha feita há 15 anos
Um dos precursores da transgenia em Tupanciretã, município com a maior produção de soja da Região Sul, Rogério Ceolin, 37 anos, começou a plantar a semente modificada ainda em 1998. Mesmo sabendo que o cultivo não era legal, o produtor decidiu apostar na biotecnologia depois de visitar propriedades na Argentina e nos Estados Unidos.
- Vimos que poderíamos alcançar um melhor rendimento, com um controle eficaz das ervas daninhas - lembra Ceolin, que comprava a semente trazida na Argentina e multiplicava para replantio no ano seguinte.
Desde então, a soja transgênica ocupou os 5 mil hectares da propriedade, onde reduziu em 50% o uso de herbicidas e aumentou em 20% a produtividade da lavoura - na última safra colheu uma média de 55 sacas por hectare. Em Mato Grosso, no município de Brasnorte, onde planta o grão em sociedade com o tio em 3,3 mil hectares, ainda mantém 30% da área plantada com semente convencional.
- Ganhamos um prêmio de R$ 5 a mais por saca de soja. Mas a redução de produtividade que tivemos na última safra não compensou. Por isso, neste ano, iremos plantar apenas sementes transgênicas - planeja o engenheiro agrônomo.