O Brasil vive uma nova onda de calor cujas máximas deverão atingir recordes históricos nos próximos dias. Mesmo cidades habituadas ao calor poderão apresentar máximas que chegam a ser 15ºC superiores à média para o período. Mas o que explica esse calor extremo?
O El Niño tem a sua contribuição, mas este e outros episódios de calor extremo que o país sofreu nos últimos meses não podem ser atribuídos exclusivamente ao fenômeno.
— O El Niño tende a favorecer o aumento de temperatura em várias regiões do planeta, e favorece eventos extremos de calor na América do Sul — diz Karina Bruno Lima, doutoranda em Climatologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e divulgadora científica.
— Mas, em setembro, tivemos uma onda de calor, e houve um estudo de atribuição para verificar qual o papel das mudanças climáticas naquela ocasião. Verificou-se que a contribuição do El Niño foi pequena em comparação com o aumento do aquecimento global antropogênico (causado pelo homem).
Na quarta-feira (8) o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) emitiu aviso meteorológico especial de nível amarelo (perigo potencial) de onda de calor. Segundo o comunicado, ele abrange áreas do Centro-Oeste e Sudeste –sobretudo São Paulo, Minas, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. O Inmet informa que o forte calor deverá permanecer em algumas áreas até a metade da próxima semana.
O nível amarelo é emitido quando a previsão do tempo indica que as temperaturas devem ficar pelo menos 5ºC acima da média pelo período de dois a três dias consecutivos. Desta vez, contudo, a previsão é de máximas ainda maiores.
Em São Paulo, a capital paulista está em estado de atenção para altas temperaturas, decretado pela Defesa Civil Municipal. Segundo o Centro de Gerenciamento de Emergências da Prefeitura, no sábado os termômetros devem marcar até 35°C. No domingo, pode chegar a 37°C à tarde.
Em alguns municípios, principalmente em Mato Grosso do Sul e Mato Grosso, as temperaturas máximas devem superar os 42°C neste semana. Na terça-feira (7), o município de Porto Murtinho (MS) já registrou 42,3°C. Em Cuiabá, a temperatura chegou a 40,4°C.
Domo do calor
Karina Lima explica que isso está associado ao que os especialistas chamam de domo de calor, ou cúpula de calor.
— É um fenômeno que ocorre quando uma área de alta pressão permanece por algum tempo na mesma região, prendendo o ar quente. (...) Isso cria condições estáveis, secas e de temperaturas altas por um período prolongado — explica
O solo ressecado deixa o ar mais quente, que acaba provocando um ressecamento cada vez maior.
A climatologista também faz um alerta.
— A gente também tem de pensar na adaptação. Precisamos nos adaptar ao mundo que já temos. Ele não está adaptado a esse aquecimento global — ressalta Karina.
Para os próximos meses, no verão, a tendência projetada pelos especialistas é de calor úmido, o que não eleva tanto as temperaturas, mas piora sensação térmica.
Além das altas temperaturas, o El Niño está associado à forte estiagem na Amazônia, que tem sofrido com rios secos, cuja navegação foi interrompida, uma série de queimadas e nuvens de fumaça sobre Manaus. O governo federal admitiu a estrutura insuficiente para combater os incêndios, disse que vai pedir mais recursos ao Fundo Amazônia no fim do ano, mas não apresentou um reforço na resposta emergencial à crise.
Pico do El Niño ainda não chegou
Relatório divulgado pela Organização Mundial de Meteorologia (OMM) na terça-feira aponta que o fenômeno El Niño, relacionado ao aumento nas temperaturas notado neste ano, deve perdurar até abril. Com isso, é muito provável que os termômetros disparem ainda mais neste fim de ano e em 2024.
O fenômeno só chegou a uma consistência, de acordo com os registros de temperatura da superfície do mar e outros indicadores, em outubro. Por isso, a expectativa da organização é que ele ainda não tenha atingido o seu maior pico.
"Provavelmente, (o El Niño) atingirá o pico, como um evento forte, em novembro-janeiro de 2024. Há uma probabilidade de 90% de que persista durante o próximo inverno/sul do hemisfério norte (verão no Brasil e demais países do hemisfério sul)", afirma a OMM.
Com a persistência das altas temperaturas e a subida ainda maior nos termômetros, os impactos no planeta e na saúde humana devem continuar, alertam os especialistas que assinam, junto à OMM, o relatório.