O planeta está se tornando mais quente há décadas, mas um aumento súbito e extraordinário nos índices de temperatura levou o clima a um território desconhecido e os cientistas ainda tentam entender o motivo. Para os especialistas, o debate sobre as causas dessa elevação excepcional mal começou.
Nos últimos dois anos, os recordes de temperatura foram repetidamente quebrados por uma série tão persistente e desconcertante que colocou à prova as melhores previsões científicas disponíveis sobre como o clima funciona.
No início de dezembro, o observatório europeu Copernicus anunciou que 2024 será o ano mais quente já registrado, o primeiro a superar o nível de aquecimento de 1,5°C em comparação com o período pré-industrial, limite estabelecido pelo Acordo de Paris.
Para os cientistas, serão necessários mais um ou dois anos para ter uma ideia mais clara do que está acontecendo.
Razões levantadas
Os cientistas concordam que a queima de combustíveis fósseis foi o principal motor do aquecimento global a longo prazo. Já a variabilidade climática natural pode influenciar nas temperaturas de um ano para o outro.
Alguns especialistas apontam que há menos nuvens em baixa altitude, o que permite maior passagem de raios solares. Outros atribuem a uma diminuição da poluição do ar, que também reflete os raios solares e, por fim, a uma menor absorção de CO2 no nível das florestas e dos oceanos.
— O aquecimento de 2023 ficou muito acima de qualquer outro ano, e 2024 será igual. Gostaria de saber o por que, mas não sei — disse Gavin Schmidt, diretor do Instituto Goddard de Estudos Espaciais da Nasa, em novembro.
Território desconhecido
Quando são queimados, os combustíveis fósseis emitem gases de efeito estufa como o dióxido de carbono, que prendem o calor perto da superfície da Terra. À medida que as emissões de combustíveis fósseis aumentavam, até alcançar um nível recorde em 2023, a temperatura média da superfície do mar e do ar subiram, em uma tendência de aquecimento consistente durante décadas.
Mas em uma onda sem precedentes, entre junho de 2023 e setembro de 2024, as temperaturas globais alcançaram níveis nunca vistos, segundo a Organização Meteorológica Mundial (OMM).
O calor foi tão extremo que fez com que 2023 e 2024 fossem os anos mais quentes da história.
— O recorde do calor global dos últimos dois anos levou o planeta a um território desconhecido — disse Richard Allan, climatologista da Universidade de Reading, no Reino Unido.
O que aconteceu ficou "no limite do que poderíamos esperar com base nos modelos climáticos existentes", complementou Sonia Seneviratne, climatologista da ETH Zurich.
Difícil de explicar
Para os cientistas, há fenômenos climáticos habituais que podem ajudar a explicar o que aconteceu.
O ano de 2023 foi precedido por um raro fenômeno do La Niña de três anos que teve um forte efeito de resfriamento no planeta ao empurrar o excesso de calor para as profundidas do oceano.
Essa energia foi liberada de volta para a superfície quando fenômeno oposto, o El Niño, começou a acontecer em meados de 2023, aumentando de uma só vez a média da temperatura mundial.
No entanto, o calor persistiu mesmo depois de o El Niño alcançar seu ponto máximo em janeiro. Os índices de temperatura não baixaram tão rápido como subiram, e novembro ainda foi o segundo mês mais quente já registrado.
— É difícil explicar isso neste momento. Se as temperaturas não baixarem mais bruscamente em 2025, realmente teremos que nos perguntar sobre a causa — disse Robert Vautard, membro do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) da ONU.