O agronegócio, que é responsável por 40% do Produto Interno Bruto (PIB) gaúcho segundo a Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), será afetado pela intensificação de eventos extremos como estiagem e tempestades. Em 2022, a seca reduziu em 5,1% o PIB do Estado, que atingiu R$ 594,96 bi.
Não será necessário eliminar plantios típicos do Rio Grande do Sul, mas agricultores, sobretudo pequenos produtores, precisarão investir em irrigação para se adaptar a temperaturas mais altas, diz o diretor-técnico da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Rio Grande do Sul (Emater-RS), Claudinei Baldissera.
Há um longo caminho pela frente. No Rio Grande do Sul, apenas 1,6% do cultivo de tabaco, 2,4% do cultivo de soja e 11,6% do cultivo de milho têm sistemas de irrigação, de acordo com o relatório Radiografia da Agropecuária Gaúcha de 2022, elaborado pela Secretaria Estadual da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural.
As variações de temperatura, ondas de frio com geadas, tempestades constantes e ciclones com rajadas de vento também exigirão de produtores um cuidado maior, sobretudo por conta das possíveis alterações no ciclo de crescimento das culturas e na presença de pragas e fungos.
— São olhares que pedirão ao agricultor adequar o manejo a esse período vivenciado. Alface, por exemplo, é uma cultura sensível ao calor do verão e que adquire preço maior. A Embrapa tem variedades resistentes ao período de verão e que foram testadas, com bons resultados. A irrigação e o cuidado do solo, com reservatórios dimensionados para dar conta das necessidades, precisarão ser foco — diz Baldissera.
As mudanças climáticas e as perdas com a estiagem foram a razão para o citricultor Fabiano Gustavo Viegas, de 37 anos, implementar um sistema de irrigação em toda a sua propriedade de 17 hectares em Montenegro, no Vale do Caí, onde produz bergamotas.
Em um passeio na última quinta-feira (17) ensolarada, ele mostrou para GZH os canos que aplicam irrigação localizada, um sistema que direciona água no solo de forma mais eficiente.
Viegas ainda faz o manejo do solo com azevém e nabo-forrageiro, espécimes plantados para proteger a terra do sol, ajudar a água a permanecer no solo e trazer nutrientes. Agora, o citricultor não teme mais a seca.
— A estiagem de 2006 nos afetou muito e começamos a pensar em fazer algo. Em 2011, implementamos um açude. Em 2019, no ápice da seca, peguei uma irrigação por aspersão (jato) emprestada do vizinho e salvei nossa plantação. Em seguida, investi em irrigação. Foram R$ 42 mil, mas valeu a pena. Ultimamente, temos extremos com muita chuva em poucos períodos seca. Se não investir em irrigação, a gente fica com prejuízo pela estiagem — diz o citricultor.
Em entrevista a GZH, o agrônomo e prêmio Nobel da Paz Rattan Lal, referência mundial em ciência do solo, defendeu que a agropecuária pode ser a solução para o aquecimento global – se produtores investirem no mercado de carbono e no manejo de cursos hídricos e do solo.
Para o vice-presidente da Farsul, Domingos Lopes, o agronegócio do Rio Grande do Sul já é referência nacional em práticas verdes, mas não tem sucesso em comunicar as técnicas avançadas usadas no solo. Ele pontua que, desde a COP-26 no ano passado, o agro deixou de ser problema e passou a ser solução para mitigar os efeitos do aquecimento global.
— O Brasil é o protagonista na discussão. Somos modelo de agricultura de baixo carbono a ser seguido no mundo. Quem usa agricultura de baixo carbono não é o modelo americano, europeu ou asiático, é o modelo brasileiro. Temos plantio direto, que o resto do mundo não utiliza. Temos utilização de sistemas de irrigação e matriz energética limpa. Temos 66% das áreas de preservação reservadas, e o mundo tem abaixo de 15%. A atividade agropecuária e silvícola é emissora, mas tem potencial, se utilizadas técnicas de baixo carbono, de ser neutra ou negativa em carbono com integração lavoura-floresta e reservação de carbono no solo. Temos que trabalhar para reduzir o desmatamento ilegal e as queimadas, mas também valorizar o fato de termos seis biomas que precisam ser preservados — afirma.