Um mapeamento sobre exploração madeireira aponta que, entre os meses de agosto de 2019 e julho de 2020, metade de toda essa atividade na Amazônia ocorreu no Mato Grosso. Ao todo, foram explorados 234,2 mil hectares de florestas nativas no Estado — deste total, 38% registraram extrações ilegais.
O desmatamento, englobando todos os tipos de causas — como abertura de pastagem, por exemplo —, costuma ser liderado pelo Pará, mas é do Mato Grosso que tem saído a maior parte dos troncos que abastecem o setor. Na prática, a área explorada para fins exclusivamente madeireiros no Mato Grosso foi equivalente à soma do volume extraído nos outros seis Estados da Amazônia Legal com atividade madeireira: Acre, Amazonas, Amapá, Pará, Rondônia e Roraima.
Os dados fazem parte de um relatório técnico do Instituto Centro de Vida (ICV). Para realizar o levantamento, o instituto se baseia no Sistema de Monitoramento da Exploração Madeireira (Simex) do Imazon, e em informações da Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Mato Grosso (Sema/MT). São mapeadas as áreas exploradas a partir do processamento das imagens de satélite. Em seguida, os dados são contrapostos às áreas com retiradas de madeira com aquelas que possuem autorizações de exploração florestal.
O cruzamento de dados revela que um total de 88.386 hectares de floresta nativa foram alvos de extrações criminosas no ciclo de agosto de 2019 a julho de 2020.
Trata-se da maior área de exploração ilegal verificada no Mato Grosso nos últimos sete anos, só atrás do ciclo 2012/2013, quando o crime avançou sobre 139.867 hectares de floresta nativa. No intervalo 2018/2019, por exemplo, a ação criminosa explorou 80.333 hectares de mata. Houve, portanto, um aumento de 10% de um período para o outro.
A exploração de madeira também cresceu em áreas onde a atividade é legalizada. Segundo o ICV, madeiras legalizadas saíram de 145.904 hectares de florestas onde essa exploração é permitida, o que equivale a 62% de toda a área explorada no Mato Grosso. Mesmo assim, foram identificadas inconsistências de informações em 21% das autorizações de exploração legal.
Não há mistério algum sobre as localidades em que o crime da floresta tem agido, desde sempre. Do total de exploração ilegal verificada em 2020, 70% ocorreu em imóveis rurais já cadastrados pelo órgão ambiental do Mato Grosso. Da mesma forma, sabe-se que os dez municípios com maior área explorada ilegalmente no período representam 67% de toda a extração ilegal em território mato-grossense.
Desses dez municípios, somente Aripuanã e Colniza, juntos, respondem por 31% da área total explorada legalmente em Mato Grosso.
A ilegalidade nos imóveis cadastrados ocorreu em um total de 469 imóveis. Desse montante, 100 imóveis responderam por 60% da área explorada ilegalmente nessa categoria. Da área total explorada de forma ilegal em imóveis cadastrados, 67% estão em imóveis que já possuem Cadastro Ambiental Rural (CAR), Licença Ambiental Única ou Florestal (LAU/LF) ou ambos, mas não detinham autorização.
"Para contornar esse cenário de ilegalidade, as soluções passam por ampliar a transparência e assegurar a integração dos sistemas estaduais de monitoramento e controle florestal ao Sinaflor (sistema nacional de controle do Ibama)", afirmam, no documento, os pesquisadores Vinícius Silgueiro, Bruno Cardoso, Ana Paula Valdiones e Lucas Batista.
"Informações centralizadas, integradas e acessíveis auxiliam na implementação de uma rotina de monitoramento da exploração madeireira em tempo real, o que colabora para responsabilização da prática ilegal."
Os especialistas afirmam que o alto volume da ilegalidade é o que tem contaminado e impedido a valorização da produção legal, porque cria uma concorrência desleal que inviabiliza as demais operações. Em Mato Grosso, o setor industrial e comercial baseado na madeira nativa é base da economia de 44 municípios, gera cerca de 90 mil postos de trabalho diretos e indiretos e representa o quarto maior na economia do Estado. São 3,8 milhões de hectares de áreas sob manejo florestal regularizado, em ciclos de corte definidos de 25 a 35 anos.
Em março de 2021, o Ibama chegou a bloquear a emissão do Documento de Origem Florestal (DOF) para Mato Grosso e Pará, devido à falta de integração dos sistemas estaduais ao Sinaflor, o sistema federal. Após decisões judiciais, a Justiça Federal fixou prazo para que Mato Grosso promovesse sua integração. Em agosto, a Sema/MT declarou que a integração entre os sistemas estaduais e o Sinaflor foi realizada. Os próximos passos devem ser a implementação da rastreabilidade.
Terras indígenas
As áreas demarcadas dos povos originários são, hoje, um dos principais alvos dos criminosos, justamente por serem as terras mais preservadas. Os dados do levantamento mostram que houve um aumento de 50% da área explorada ilegalmente em terras indígenas e de 16% em unidades de conservação, quando estas são comparadas com o período anterior.
As Terras Indígenas concentraram 56% de toda a exploração madeireira ilegal em áreas protegidas, com 6 mil hectares. Os principais alvos foram as terras Aripuanã e Roosevelt, com 2,9 mil hectares e 1 mil hectares explorados ilegalmente em seus territórios, respectivamente. As duas terras indígenas representam 67% do total mapeado nessa categoria.
Já unidades de conservação, que são florestas protegidas por lei, a exploração madeireira ilegal atingiu 4,7 mil hectares. O Parque Estadual Tucumã, localizado no noroeste do estado, divisa com Amazonas, foi o mais impactado, com 2,9 mil hectares, o que representa 61% do total contabilizado em unidades de conservação.
Nos projetos de assentamento rurais, a exploração madeireira ilegal totalizou 3,5 hectares em oito assentamentos. Houve um aumento de 406% na área total explorada ilegalmente em assentamentos, em relação ao ano anterior, quando 691 hectares foram explorados nessa categoria.