Um aliado capaz de auxiliar o Estado em crises sanitárias, na produção de pesquisas sobre medicamentos e no desenvolvimento de vacinas. Esses são alguns dos ganhos projetados com a criação do Laboratório Multiusuário de Nível de Biossegurança 3 (NB3), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
O centro, que será inaugurado na segunda-feira (14), trabalhará com microrganismos – como bactérias e vírus – que têm alta capacidade de infectividade em humanos e outros seres vivos. O investimento foi de R$ 4,5 milhões, com recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (Fapergs) e da universidade.
Como funciona o laboratório
O centro foi instalado em uma área de 80 metros quadrados no Instituto de Ciências Básicas da Saúde (ICBS), no bairro Santa Cecília, em Porto Alegre. Zero Hora esteve no local na sexta-feira (11), antes do início das atividades. Depois do começo dos trabalhos científicos, previsto para 2025, a entrada será permitida apenas a pessoas autorizadas.
Para chegar às salas de pesquisa, os técnicos devem fazer um percurso que apenas é liberado caso todos os protocolos de segurança sejam seguidos.
O caminho começa com a entrada no laboratório Nível de Biossegurança 2 (NB2), que já existia na instituição. Foi ali que a UFRGS realizou 145 mil testes de Sars-CoV-2 para a prefeitura da Capital e para o governo do Estado durante a pandemia de Covid-19.
O espaço é dotado de um sistema de pressurização, que faz com que a pressão seja negativa. Somado a isso, o ar do interior é filtrado antes da liberação para a parte externa. As duas medidas são feitas para impedir que os microrganismos escapem do local.
— É um bunker fechado, onde tudo é tratado antes de sair, porque nada pode ir direto para o ambiente — resume Marcelo Lazzaron Lamers, professor da UFRGS e vice-diretor do ICBS.
Cuidados com a segurança
Para o acesso, é necessário colocar óculos de proteção, luvas e um traje especial, procedimento feito em um vestiário. Após vestir os equipamentos de proteção, outra porta é liberada e o técnico entra no NB3.
As entradas são feitas por meio de um sistema de leitura facial, e as amostras são inseridas através de uma janela que conecta os dois laboratórios.
— A ideia é que não permaneça material estocado para não haver risco em caso de um acidente. As amostras presentes ali serão as que estão sendo utilizadas no projeto e devem ser autoclavadas (limpas por meio do uso de vapor sob pressão e altas temperaturas) no mesmo dia — relata Juciana Clarice Cazarolli, técnica de laboratório.
A saída do NB3 tem um caminho exclusivo, que não tem conexão com a entrada. O traje é descartado e um chuveiro automático banha o técnico, que só tem a liberação permitida após a água parar, em um espaço parecido com um box de banheiro.
Para facilitar a limpeza, cadeiras e bancadas são feitas de inox, material que facilita a esterilização.
Necessidade estimulou o investimento
A mobilização para criar o espaço ocorreu durante a pandemia, quando a falta da estrutura foi um empecilho no enfrentamento da covid-19. Naquele momento, os pesquisadores podiam fazer apenas os testes no NB2 e não conseguiam manipular o Sars-CoV-2 para estudá-lo ou criar vacinas.
— Teríamos respostas mais rápidas na descrição do vírus e como ele atuava se tivéssemos esse laboratório na época. Poderíamos ter testado medicamentos quando não se sabia se funcionariam ou não para o tratamento. Agora vamos conseguir trabalhar com esses microrganismos com toda a segurança — afirma Ilma Simoni Brum da Silva, diretora do ICBS.
A direção do instituto buscou inspiração em laboratórios NB3 da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e da Universidade Federal do Ceará (UFC). O RS tem outros dois do tipo: um no Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Tuberculose (INCT-TB), na PUCRS, em Porto Alegre, e outro na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
O acréscimo da UFRGS em relação aos das outras instituição é uma sala de manipulação de animais vivos, o que permitirá testes para a elaboração de medicamentos e imunizantes, conforme Fabrício Campos, professor da UFRGS e um dos coordenadores do espaço.
— Esse laboratório dá autonomia para isolar os vírus das amostras, realizar experimentos, testar antivirais e a eficácia de vacinas. Durante a pandemia, ficamos dependentes de outros Estados para isso, porque, sem uma estrutura como esta, não é possível trabalhar com vírus de nível três de biossegurança — afirma.
Segundo Campos, o local poderá ser usado para o estudo de novas variantes de doenças como a covid-19, mpox, febre amarela e gripe aviária (H5N1).
— Há muita diferença entre realizar o diagnóstico a nível molecular (o que foi feito no NB2) de fazer o isolamento viral, que é quando multiplicamos células para testes com antivirais e vacinas. O Sars-CoV-2 deixou claro o quão importante é ter uma estrutura como esta. Hoje o Estado está preparado para outras pandemias — pontua.
O laboratório será multiusuário, ou seja, aberto para o trabalho de outras instituições de ensino e iniciativa privada, mas a supervisão é feita pela UFRGS. Segundo a direção, ainda neste ano, os técnicos passarão por uma fase de treinamentos oferecida pela empresa que construiu o espaço. A projeção do ICBS é que os cientistas comecem a usar o laboratório no primeiro trimestre de 2025.