“Ameaça à segurança nacional”. Assim o Governo dos Estados Unidos definiu e embasou sua decisão de banir o TikTok no país, em projeto de lei sancionado pelo presidente, Joe Biden, nesta quarta-feira (24). O fato gerou debate sobre o impacto que medida pode ter, inclusive em outros países. No Brasil, entretanto, as chances de que o mesmo ocorra são reduzidas. Isso porque o cenário de tensão geopolítica entre China e Estados Unidos é determinante para a decisão.
O advogado Juliano Madalena, que é coordenador do curso de pós-graduação em Direito Digital da Fundação Escola Superior do Ministério Público (FMP), aponta que o banimento de uma rede social de um país é algo extremamente grave e que deve ser analisado com muita cuidado, já que o desenvolvimento de plataformas digitais é uma atividade lícita.
— Estamos falando de um certo atropelo, é uma medida extremada e vejo com muita preocupação uma conduta como essa. Isso tende a representar mais um desafio geopolítico do que jurídico, pois há uma grande discussão acerca dos governos norte-americano e chinês. Hoje, no Brasil, não vejo elementos para banir essa rede social — comenta o professor, que também é presidente da Comissão Especial de Proteção de Dados e Privacidade da OAB/RS.
Enquanto um dos principais argumentos dos Estados Unidos é a segurança nacional, já que o país acusa o TikTok de utilizar os dados de 170 milhões de norte-americanos para espionagem, Madalena afirma que esse ainda é um tema pouco discutido no Brasil. Na visão do especialista, isso representa um problema porque existe a chamada transferência internacional de dados, já que as redes sociais utilizadas pelos brasileiros são estrangeiras – assim, é possível que ocorra uma transferência de dados para servidores de outros países.
— Essas redes são utilizadas pela população, por agentes públicos e entidades governamentais, e não se olha com a devida cautela para como são tratados esses dados no Exterior. O Brasil tem lei para isso, temos uma autoridade nacional de proteção de dados, mas carece de meios e recursos para poder fiscalizar no nível necessário.
Madalena ressalta ainda que o Brasil observa a regulamentação da internet em outros países para que possa avançar em seus projetos voltados ao tema. O especialista aponta que existe uma espécie de diálogo entre as condutas jurídicas americanas e brasileiras.
— A internet é uma rede aberta e transnacional, então, seu modelo de regulação exige a cooperação de diversos agentes, sejam Estados, pessoas ou empresas. Assim, essa lei norte-americana influencia as condutas políticas e jurídicas de outros países. Vem mostrar que, diferentemente do que se pensava no passado que a internet era um espaço sem lei, o Estado consegue sim regular e banir uma aplicação.
Tensão geopolítica
O projeto de lei determina que a ByteDance, empresa chinesa que administra o TikTok e recorreu da decisão, venda a plataforma para uma empresa norte-americana em até 270 dias, com possibilidade de prorrogação por mais 90 dias. Caso a ação não se concretize, a rede social será banida dos Estados Unidos.
Estados Unidos e China estão em lados opostos na Guerra da Ucrânia. Recentemente, o governo norte-americano aprovou um pacote de ajuda para aliados no exterior, que prevê o envio de US$ 95 milhões para países como Ucrânia e Israel, ambos “desafetos” dos chineses, ao lado da Rússia na disputa com os ucranianos.
A lei também prevê a doação de US$ 8,12 bilhões para Taiwan, que declarou independência da China, que não reconheceu o movimento. Chefe da diplomacia norte-americana, Antony Blinken está em Pequim, capital chinesa, para pressionar o país a moderar suas ações com relação ao Taiwan. Por isso, a decisão de banir o TikTok, no mesmo dia em que o representante norte-americano está na China, seria uma forma de pressão ao país oriental.