O Facebook sabia bem mais do que admitiu e esquivou-se de agir diante de escândalos como a interferência russa na eleição presidencial norte-americana e a apropriação de dados de usuários pela empresa Cambridge Analytica. Essas são algumas das conclusões de uma extensa investigação jornalística publicada nesta semana pelo jornal The New York Times, sob o título "Adie, negue e desvie: como a direção do Facebook lidou com a crise".
Assinada por uma equipe de cinco jornalistas, a reportagem foi baseada em testemunhos de mais de 50 pessoas, muitos deles concedidos com a condição do anonimato. Com mais de 2,2 bilhões usuários, o Facebook é dono também do Instagram e do WhatsApp, este último envolvido em suspeitas de impulsionamento ilegal de postagens e disseminação de notícias falsas durante a recente campanha eleitoral no Brasil.
Segundo a reportagem do New York Times, em 2016, no período que antecedeu a eleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos, um funcionário do Facebook especializado em ciberguerra russa identificou atividades suspeitas e comunicou o chefe de segurança da rede social, Alex Stamos. Hackers russos estavam invadindo contas de integrantes do Partido Democrata (da oponente de Trump, Hillary Clinton), o que levou ao roubo e vazamento de milhares de e-mails de líderes do partido. Também estariam por trás da divulgação de notícias falsas na plataforma.
Stamos iniciou uma investigação e informou superiores, mas o Facebook não fez qualquer alerta sobre a ação russa durante a campanha. Em dezembro de 2016, Mark Zuckerberg, fundador e CEO do Facebook, chegou a ridicularizar publicamente a ideia de que notícias falsas na rede social ajudaram a eleger Trump. O New York Times afirma que Stamos, alarmado diante do que parecia ser um desconhecimento do chefe a respeito das descobertas de sua equipe, procurou Zuckerberg e a executiva operacional da empresa, Sheryl Sandberg. Nessa ocasião, Sheryl teria se voltado contra Stamos, dizendo que, ao investigar a atividade russa sem aprovação, ele havia deixado a empresa "exposta legalmente".
Apesar disso, afirma a reportagem, Zuckerberg e Sandberg resolveram expandir a investigação sobre fake news. Em janeiro de 2017, o grupo criado para fazer o trabalho já havia percebido que Stamos mal havia arranhado a superfície da interferência russa e propôs divulgar um comunicado público sobre o assunto.
Os executivos do Facebook negaram-se a fazer isso.
Joel Kaplan, vice-presidente da companhia e um conhecido republicano que trabalhou no governo George W. Bush, argumentou que uma divulgação dos achados levaria o Partido Republicano a voltar-se contra a empresa. Também afirmou que, se o Facebook derrubasse as páginas de divulgação de fake news mantidas pelos russos, os usuários da rede social acabariam por se sentir ludibriados. Segundo o New York Times, Kaplan contou que sua própria sogra havia seguido uma página criada por trolls russos.
Quando um estudo sobre o assunto foi finalmente publicado pelo Facebook, em abril de 2017, a palavra "Rússia" sequer foi mencionada.
"Decidido a crescer, o par (Zuckerberg e Sandberg) ignorou os sinais de alerta e depois procurou escondê-los da vista do público", afirma o New York Times. "Em momentos críticos dos últimos três anos, eles estavam distraídos por projetos pessoais e passaram decisões políticas e de segurança para os subordinados."
Zuckerberg e Sandberg não aceitaram falar com os repórteres do New York Times. Stamos deixou a empresa. Em nota, o Facebook afirmou: "Este foi um momento difícil para o Facebook, e toda a nossa equipe de gerenciamento se concentrou em resolver os problemas que enfrentamos. Embora estes sejam problemas difíceis, estamos trabalhando duro para garantir que as pessoas achem nossos produtos úteis e que protegemos nossa comunidade de maus agentes".