A defesa do líder de facção que foi executado a tiros dentro da Penitenciária Estadual de Canoas 3 no último sábado (23) divulgou uma nota nesta terça-feira (26). No texto, os advogados Jader Santos e Cassyus Pontes elencam todas as suas tentativas para que Jackson Peixoto Rodrigues, 41 anos, o Nego Jackson, fosse retirado da galeria para onde foi levado, onde ele havia alertado que corria risco de vida.
Os advogados dizem no texto que o preso foi transferido da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) para a Pecan 3 no fim da tarde da terça-feira passada, 19 de novembro, "sem qualquer notificação prévia à sua defesa". Segundo eles, apenas no dia 20, "após contatos insistentes com o Núcleo de Gestão Estratégica do Sistema Prisional (Nugesp)" que eles foram informados onde ele estava.
A defesa aponta que Jackson teria lhe informado já no dia 20 que foi alocado na mesma galeria que integrantes de uma facção rival. Segundo eles, no mesmo dia foi informado "o risco diretamente aos agentes penitenciários na própria Casa Prisional, mas nenhuma providência efetiva foi tomada."
Pedidos de realocação
Segundo a defesa, na quinta-feira (21), dois dias antes do crime, foram encaminhados três requerimentos administrativos sobre a "incompatibilidade", solicitando a retirada de Jackson da triagem. Os advogados dizem que também foi feito contato presencial na Pecan, informando "os riscos eminentes para a direção e administração setorial" da casa prisional.
A defesa diz que também indicou "galerias seguras dentro da Pecan 3 (galerias D ou B)" para onde ele poderia ser transferido, ou ainda, "para outra unidade prisional que garantisse sua segurança". Os advogados dizem que somente nessa data ainda tivreram acesso à decisão que determinou a transferência dele para a Pecan 3.
Segundo a defesa, a decisão trazia uma "determinação expressa para que fosse garantida sua integridade física e alocado em um local compatível com os demais apenados". Com base nesse texto, a defesa pediu judicialmente a realocação de Jackson.
Quem era Nego Jackson
Jackson chegou a ser considerado o foragido mais procurado do Rio Grande do Sul em 2017, até ser capturado no Paraguai, pela polícia da cidade de Pedro Juan Caballero, e posteriormente transferido de volta para Brasil. Ele esteve em presídios federais brasileiros até ser transferido para o Rio Grande do Sul em 2020.
O criminoso tinha uma extensa ficha criminal: tráfico de entorpecentes, homicídio doloso, lavagem de dinheiro e organização criminosa. De acordo com o Comando de Policiamento Metropolitano, Jackson tem ligação com 29 homicídios. São assassinatos em que ele teria participação como mandante ou executor.
Nego Jackson era um dos principais líderes de uma facção de Porto Alegre. Ele teria arregimentado facções menores para montar um dos maiores grupos criminosos da capital gaúcha.
Carta à direção
Na sexta-feira (22), a defesa aponta que Jackson entregou uma carta ao diretor da unidade prisional apontando que corria risco de vida e solicitando sua remoção do local, enquanto não havia retorno sobre os requerimentos administrativos e judiciais. Uma cópia da carta foi entregue à defesa.
Pedido de urgência e habeas corpus
Os advogados ressaltam que protocolaram pedido de urgência no plantão da Comarca de Porto Alegre na madrugada de sábado (23). Eles anexaram a carta de Jackson e reiteraram o risco de vida que ele apontava estar correndo e relataram falta de medidas que garantissem a sua integridade física.
A defesa aponta que "apesar da juíza plantonista notificar a administração da Pecan III para garantir sua segurança, nenhuma providência foi adotada na triagem".
Na mesma data, foi impetrado um habeas corpus preventivo. O pedido teve liminar deferida, determinando a retirada de Jackson da triagem, quase duas horas após sua morte.
"Pena de Morte"
Em sua manifestação, os advogados criticam o sistema prisional e dizem que o "Jackson Peixoto Rodrigues foi condenado à morte no exato momento em que a administração prisional o retirou da PASC e o colocou em local incompatível com o devido cumprimento de pena, junto de seus inimigos, selando seu destino".
"A tragédia começou quando Jackson foi retirado da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas, (PASC) onde estava seguro, e transferido para a PECAN III, uma unidade de média segurança, onde foi inserido junto a seus inimigos declarados. Mesmo após inúmeros alertas da defesa e do próprio Jackson, que entregou uma carta relatando sua vulnerabilidade, a administração penitenciária ignorou o risco. Sabendo da incompatibilidade com os demais detentos e contrariando a ordem judicial que determinava sua realocação em local seguro, Jackson foi mantido na triagem, à mercê de seus desafetos. Essa omissão deliberada da administração da PECAN III e o descumprimento da decisão judicial transformaram o ambiente prisional em palco para a execução de uma sentença de morte. No atual Estado Democrático de Direito, a pena de morte não é prevista. Sua morte não foi um acaso ou uma fatalidade: foi o resultado previsível de uma sequência de negligências, omissões e descaso das autoridades responsáveis", diz o texto.
Investigação
Os suspeitos pelo crime são Rafael Telles da Silva, o Sapo, uma das lideranças de uma facção rival à de Nego Jackson, e Luis Felipe de Jesus Brum, também integrante do mesmo grupo e preso pelo assalto milionário ao aeroporto de Caxias do Sul, em junho.
Ambos foram detidos em flagrante após a morte de Nego Jackson e tiveram prisão preventiva decretada. Segundo a Polícia Civil, ao serem ouvidos, optaram por se calar.
Os dois foram removidos da Pecan na madrugada de sábado para domingo, segundo a Polícia Civil, “assim que foram realizadas as oitivas com a Polícia Civil e demais procedimentos de praxe”. Por questões de segurança, não é informado o local de destino dos presos.
Contraponto
Procurada pela reportagem, a Secretaria de Sistemas Penal e Socioeducativo se manifestou por meio de nota na qual diz que "a Polícia Penal reconhece que houve uma falha na segurança do Complexo Prisional de Canoas." O texto diz também que a transferência de Jackson para a Pecan 3 ocorreu "a partir de autorização judicial". Veja íntegra abaixo:
"A Polícia Penal reconhece que houve uma falha na segurança do Complexo Prisional de Canoas. Por isso, ontem (25), durante a durante coletiva de imprensa, o governador em exercício determinou o afastamento temporário do diretor e de mais quatro servidores do estabelecimento durante a investigação.
Sobre a transferência, a instituição esclarece que realizou a remoção de Jackson Peixoto Rodrigues da Pasc a partir de autorização judicial.
Reitera ainda o compromisso em apurar os fatos e lamenta a perda de uma vida dentro do sistema prisional."