Conduzido por colegas profissionais da segurança pública e familiares, o caixão contendo o corpo de Éverton Kirsch Júnior, 31 anos, morto no tiroteio em Novo Hamburgo, deixou a Capela Ecumênica do Crematório e Cemitério Parque Jardim da Memória, em Novo Hamburgo, no Vale do Sinos, por volta das 11h30min desta quinta-feira (24).
O anúncio da saída do caixão de dentro da capela se deu por sirenes de três viaturas do 1° Batalhão de Choque da Brigada Militar (BM) de Porto Alegre.
Por cerca de um minuto, as sirenes tocaram ao mesmo passo em que familiares, amigos, colegas e desconhecidos — que compareceram à despedida após se sensibilizarem com a morte do soldado — se aglomeravam ao lado do caixão.
Envolto em uma bandeira do Rio Grande do Sul, o caixão foi conduzido por cerca de um quilômetro até o local destinado para o sepultamento. Um carro da força tática da Brigada Militar seguia na frente.
Reunidos, entes queridos e afetos do soldado Kirsch observavam a guarda fúnebre realizar o tradicional cortejo de guerra, que homenageia profissionais da segurança pública mortos em serviço.
Seguido de um toque de trombeta, oito policiais militares, que portavam um fuzil cada, dispararam no solo uma sequência de três tiros.
Um novo toque de trombeta anunciou o momento de silêncio, que seguiu de uma oração e um cântico religioso.
Amigos e familiares de Kirsch disseram palavras em memória do soldado, que vieram com lágrimas e abraços. Na sequência, ocorreu o sepultamento. Uma forte chuva, vinda com um céu escuro e rajadas de vento, tomou o ambiente da cerimônia momentos após o caixão tocar o solo.
Mesmo com o repentino temporal, um grupo de pessoas continuava a observar o caixão. Cerca de 300 pessoas estiveram presentes na solenidade nesta manhã.
Os atos fúnebres tiveram início às 23h de quarta-feira (23).
Autoridades lamentaram morte
Também compareceram ao funeral autoridades como o governador Eduardo Leite, o comandante da BM, Cláudio Santos Feoli, o secretário estadual da Segurança Pública, Sandro Caron, e o chefe da Polícia Civil, delegado Fernando Sodré.
— Se a gente pode andar nas ruas, se a gente pode olhar para o futuro com a confiança de que vamos ter um Estado melhor é porque tem homens e mulheres, como o soldado Kirsch, que honram a farda, a sua missão de vida — afirmou Leite durante entrevista à imprensa no velório.
Durante a fala, o governador também defendeu a criação de um sistema integrado para cruzar informações de laudos psicológicos com o registro de armas.
— Já determinei para a nossa equipe da segurança pública que sejam promovidos todos os investimentos necessários para a integração de plataformas, novos sistemas informatizados que cruzem os dados e gerem para as nossas equipes os alertas antes do atendimento às ocorrências sobre a possibilidade da existência de armas com as pessoas que estão nessa ocorrência (...) Quem tem algum tipo de histórico de problemas de saúde mental, psiquiátrico, tem de imediatamente ser cruzado também esse dado com as bases de dados de registros de armas — assinalou Leite.
O coronel Cláudio Feoli também se manifestou durante a cerimônia. Assim como o governador, ele citou a importância de um sistema integrado que indique as armas registradas por cada pessoa, acompanhado de históricos de saúde mental sobre ela. Na sequência, ele estendeu os sentimentos aos familiares do soldado Kirsch.
— É uma perda inestimável. Nós nunca vamos poder aceitar a morte de um policial como naturalizada. Quando morre um policial, morre alguém que se propôs a defender a sociedade, mesmo com o risco da própria vida. No ano passado, nós tivemos cinco policiais militares que morreram em serviço. Esse ano, até aqui, dois. Mas ao longo da história da instituição, nós temos mais de 600 policiais militares que foram mortos. Então, é importante que a sociedade toda possa reconhecer o trabalho dessas pessoas que correm em direção ao perigo quando todos fogem dele — assinalou o coronel.
Na tarde desta quinta, foi confirmada a morte do segundo policial militar presente no atendimento da ocorrência do tiroteio em Novo Hamburgo. Ele estava internado na UTI do Hospital Municipal da cidade. Rodrigo Weber Volz, 31 anos, assim como Kirsch, foi atingido por tiros e morreu em razão do ataque.
Amigos deram adeus
Vestido de policial militar, o pequeno Murilo Murad, nove anos, acompanhava a solenidade nesta manhã. Segundo o pai, Eduardo Murad Nunes, 40 anos, o menino sonha em ser policial. Esse também já foi o sonho de Kirsch, que incentivou a criança a seguir futuramente a profissão. Pela vontade de atuar nas forças de segurança pública, Murilo foi levado pelos pais para conhecer o 3º Batalhão da Brigada Militar (BPM) de Novo Hamburgo. Na ocasião, conheceu o soldado Kirsch.
— Eu gosto dele, porque ele protegeu o nosso Estado — afirmou a criança, sob autorização do pai.
Debaixo da chuva que caia, o policial militar Rafael Santos Berlese, 29 anos, foi uma das últimas pessoas a voltar do gramado em que Kirsch foi enterrado. Emocionado, ele ressaltou que o colega era muito educado e sensível aos mais necessitados.
— Sempre vou lembrar que ele era uma das poucas pessoas que sabia falar em Libras e que, por isso, pôde atender uma ocorrência em São Leopoldo. Ele sempre teve um olhar para as pessoas que normalmente recebem menos atenção. Era um grande ser humano — disse Berlese, que também atuou durante o tiroteio.
Vanira Costa Gomes, 58 anos, conheceu Kirsch ainda bebê e conta que acompanhou o crescimento do soldado, pois é amiga da família.
— Parece que arrancaram um pedaço da gente. O trabalho dele era um trabalho lindo, mas Deus quis assim, quis levar ele para trabalhar lá em cima. Era um guri ótimo, calmo, fez faculdade de DIreito, agora entrou na Brigada — lamenta a moradora de Novo Hamburgo.
Quem era Éverton Kirsch Júnior
Prestativo, educado e tranquilo. Esses são os adjetivos usados por colegas e amigos para descrever Éverton Kirsch Júnior. Ele foi uma das vítimas do tiroteio ocorrido em Novo Hamburgo, no Vale do Sinos, entre a noite de terça (22) e a madrugada desta quarta-feira (23). O policial atuava na ocorrência e foi morto em serviço.
Kirsch estava no 3° Batalhão da Brigada Militar (BPM) de Novo Hamburgo desde janeiro. Anteriormente, ele havia passado por um grupo de Sapucaia do Sul, na Região Metropolitana. Segundo colegas, ele estava na corporação desde 2018.
Conforme a Brigada Militar, o soldado morreu após levar um tiro na cabeça enquanto atendia a ocorrência. Ele morreu no local do crime. Kirsch deixa amigos, esposa e um filho de 45 dias.
Segundo amigos, Kirsch era natural de Novo Hamburgo, mas vivia com a família em Canoas. Ele era filho único, se formou em Direito pela Universidade Feevale e sempre sonhou em atuar como policial.
Ataque em Novo Hamburgo
Edson Fernando Crippa morava com os pais no bairro Ouro Branco. Na noite de terça (22), o irmão dele e a cunhada foram até a casa onde os três viviam. Vizinhos comentam que a próxima sexta-feira (25) é a data de aniversário da matriarca da família e que esse seria o motivo da reunião.
Após um desentendimento, o pai, Eugênio Crippa, chamou a Brigada Militar por volta de 22h. Ele e a mulher relataram ter sofrido maus-tratos do filho.
Ao ver os policiais na casa, por volta de 23h, Edson efetuou cerca de 300 disparos de pistola calibre 9mm e 380. Os tiros atingiram pelo menos nove pessoas, entre familiares, agentes da BM e da Guarda Municipal.
A troca de tiros com os agentes se estendeu durante a madrugada. Houve pelo menos dois momentos de confronto. Ele permaneceu dentro de casa por cerca de nove horas sob cerco da polícia.
Por volta de 8h30min de quarta-feira, os policiais militares entraram na casa e constataram a morte do atirador. Segundo a polícia, não há sinais de que ele tenha tirado a própria vida. Ainda não se sabe em que momento exatamente ocorreu a morte.