Um dos cinco PMs indiciados por envolvimento na morte de Vladimir Abreu de Oliveira, morador do Condomínio Princesa Isabel, em Porto Alegre, é suspeito de omissão de socorro. De acordo com o Inquérito Policial Militar (IPM), Bruno Pinto Gomes não teria acionado o Serviço Atendimento Móvel de Urgência (Samu) após ver a vítima ferida na ponte do Guaíba, o que contradiz o depoimento do soldado.
À Brigada Militar (BM), Bruno afirmou que ligou para o telefone 192 a partir do celular de um colega, informando que o homem estava machucado, mas que "aparentemente não corria risco de vida".
— Se tivesse percebido isso, teria o socorrido — alegou o PM.
O responsável pela investigação foi atrás de informações junto à coordenação do Samu. Ele requisitou que fosse checado se houve alguma ligação sobre um homem caído na região entre as 23h de 17 de maio e 3h de 18 de maio, a partir de três telefones.
"Verificamos todos chamados abertos nesse período, e não identificamos registro de abertura de boletim de ocorrência ou ligação com solicitação de socorro nessa região informada no ofício", disse o coordenador do Samu, em resposta.
Ao concluir a investigação, o oficial encarregado afirmou que o soldado Bruno "foi negligente ao não prestar tal atendimento e, ao contrário do que alegou em seu depoimento, conforme ofício remetido pela Samu, não foi feita qualquer ligação para o 192 solicitando atendimento para qualquer indivíduo na ponte do vão móvel do Guaíba, deixando evidenciada a existência de indícios da prática do crime de omissão de socorro".
A investigação da BM contou com o depoimento de 10 pessoas, entre moradores, vizinhos e policiais da Força Tática do 9º Batalhão de Polícia Militar. Cinco PMS foram indiciados pela BM por envolvimento na morte de Vladimir.
Dois deles, um sargento e um soldado, apontados como os responsáveis pelas agressões, estão presos preventivamente. São eles o segundo-sargento Felipe Adolpho Luiz e o soldado Lucas da Silva Peixoto.
Os outros três soldados, incluindo Bruno, foram afastados, conforme a Brigada Militar.
Movimentações na Justiça
Na sexta-feira (12), a Justiça Militar Estadual negou o pedido do Ministério Público (MP) para encaminhar à Justiça Comum a investigação sobre o caso. A Promotoria alegava que, com base nas provas até o momento, há indícios de homicídio qualificado e, por isso, o caso deveria ir ao Tribunal do Júri.
A Justiça Militar, por sua vez, entendeu que "as provas até então colhidas indicam que os militares, em tese, teriam incidido no crime de tortura seguida de morte", um crime previsto no Código Penal Militar.
O entendimento da Justiça Militar, no entanto, não é conclusivo e pode mudar após a Polícia Civil finalizar sua investigação sobre o assassinato de Vladimir, que ainda está aberta. Segundo o diretor do Departamento de Homicídios, delegado Mario Souza, a previsão é de que o inquérito sobre o caso seja remetido ao Judiciário até o final de julho.
Relembre o caso
Segundo familiares e testemunhas, Vladimir estava em casa, no Condomínio Princesa Isabel, quando foi abordado pela BM, em 17 de maio. Sem notícias dele, a família fez buscas em delegacias e hospitais, mas não teve resultado.
O corpo de Vladimir foi encontrado no dia 19 de maio, no bairro Ponta Grossa, cerca de 10 quilômetros de distância de onde havia sido visto pela última vez. A irmã, Letícia Abreu de Oliveira, afirmou que o corpo da vítima apresentava sinais de tortura.
— A minha prima reconheceu o corpo, ele tá todo machucado. A perita falou: "Torturaram ele, torturaram ele antes de matar". E ele não tinha inimigo, não tinha guerra, não era envolvido com tráfico — disse, na época.
Após serem informados de que Vladimir havia sido encontrado morto e com ferimentos pelo corpo, cerca de 50 pessoas bloquearam a avenida em frente ao condomínio. Dois ônibus foram incendiados. Os motoristas contaram à polícia que os manifestantes pediram para todos que estavam nos veículos saíssem. Ninguém ficou ferido.
A Polícia Civil prendeu, no dia 3 de junho, quatro suspeitos de incendiar os dois ônibus. No dia 19 de maio, eles teriam comprado o combustível em um posto de gasolina e colocado fogo nos veículos, segundo a investigação.
No dia 7 de junho, dois PMs foram presos preventivamente. Eles foram encaminhados para o Presídio Militar de Porto Alegre.
Contrapontos
A reportagem segue em busca da localização da defesa do soldado Bruno Pinto Gomes. Até a publicação desta matéria, não havia sido encontrada.
Confira a nota da defesa de Adolpho e Peixoto
"A defesa de Lucas e Adolpho sempre insistiu que a investigação deveria ser tratada com mais tranquilidade e cautela. Em crimes de complexidade e repercussão, nenhuma prova será absoluta. Nenhuma versão será superior àquela ou esta evidência. A versão prestada pelos policiais anteriores que foram agraciados por sequer terem sido afastados, foi contestada nos interrogatórios. Importante dizer que há uma janela de tempo, algo em torno de 18 minutos que Vladimir permaneceu sozinho com os outros policiais. Acreditamos que houve incriminação dos nossos clientes. Aguardamos as investigações da Polícia Civil que está examinando cada detalhe. Diversamente, a Brigada optou por seguir uma visão única, sem explorar melhor os fatos nem sequer se questionar eventuais motivações pessoais, sobre a morte de Vladimir. Sobre a decisão da Justiça Militar em indeferir o pedido de declínio de competência, sempre afirmamos que nos parece claro que a Vara do Júri tenha que decidir sobre tais fatos. Houve apressamento da Justiça Militar em prender e prendeu errado e injustamente os policiais que defendemos. Tanto é verdade que desde sempre pedimos a auditoria militar que se assegurasse da existência de investigação na Polícia Civil, evitando prejuízos e demais interpretações conflitantes. Estamos aguardando as diligências e resultados para poder infirmar ainda mais a versão dada contra nossos clientes."