Miguel dos Santos Rodrigues, sete anos, deixou o município de Paraí, na Serra, para viver com a mãe, Yasmin Vaz dos Santos Rodrigues, e a companheira dela Bruna Nathiele Porto da Rosa. Até então, o menino estava aos cuidados da avó materna. Pouco mais de três meses depois, em julho de 2021, em Imbé, no Litoral Norte, as duas procuraram a polícia para relatar que o garoto havia sumido. O caso culminou com a prisão da mãe e da madrasta, pelo assassinato da criança. O corpo, que teria sido arremessado no rio, nunca foi encontrado. Nesta quinta-feira (4), as duas são submetidas a julgamento pelo crime.
Yasmin e Bruna, que estão presas desde então, serão julgadas a partir das 9h no Fórum de Tramandaí. Elas respondem pelo homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, com emprego de meio cruel e recurso que dificultou a defesa da vítima), por tortura, já que, conforme a denúncia do MP, submetiam a criança a agressões físicas, privação de liberdade e intenso sofrimento emocional, e também pela ocultação do cadáver. Os bombeiros realizaram buscas pelo corpo de Miguel ao longo de 48 dias, mas a operação foi encerrada sem localizar a criança.
A expectativa é de que o julgamento das rés se estenda por até dois dias. A primeira etapa será o sorteio dos sete jurados da comunidade que integrarão o Conselho de Sentença. Eles serão os responsáveis por decidir se Bruna e Yasmin são culpadas ou inocentes. Logo depois, se dará início aos depoimentos das nove testemunhas: três de acusação, que são ouvidas primeiro, e seis de defesa. As testemunhas devem responder aos questionamentos do juiz Gilberto Pinto Fontoura, titular da 1ª Vara Criminal de Tramandaí, do Ministério Público e das defesas.
Após essa etapa, serão interrogadas as rés, que podem optar por permanecerem em silêncio. A expectativa, no entanto, é de que tanto Yasmin quanto Bruna falem sobre o caso. Na fase de instrução do processo, somente a madrasta apresentou sua versão do crime. Bruna alegou que quem espancou o menino foi a companheira. Isso teria deixado, inclusive, uma marca na parede do quarto da pousada onde os três viviam em Imbé.
Posteriormente, a criança teria ficado horas dentro de um poço de luz e de um armário, o que seria uma forma de castigo. Na sequência, com a criança já morta, Yasmin teria colocado o corpo do filho na mala e depois as duas teriam seguido até o Rio Tramandaí. Pela linha apresentada pela defesa até o momento, Bruna deve manter o relato de que não teve participação direta na morte.
Debates
Depois dessa etapa, que pode ou não ser concluída ainda nesta quinta-feira, a depender da duração dos relatos, iniciam-se os debates. Como são duas rés, o tempo para acusação e defesas apresentarem suas alegações aos jurados é estendido. Neste caso, o Ministério Público terá duas horas e meia, e as defesas também terão o mesmo tempo (dividido entre elas).
Logo na sequência, ainda há possibilidade de o MP pedir uma réplica, que seria um segundo momento para fazer suas argumentações aos jurados. Para essa etapa, a acusação pode usar até duas horas – por se tratar de mais de um réu. Da mesma forma, as defesas ainda terão mais duas horas (divididas entre elas) para fazer a chamada tréplica. Caso todo esse tempo seja utilizado, já que as partes podem optar por falar menos do que o previsto, os debates podem chegar a duração de até nove horas, sem contar os intervalos.
Com o fim das argumentações, os jurados se reúnem para votar sobre o caso. É neste momento que eles definem o destino das rés, se devem ser consideradas culpadas ou inocentes em relação a cada crime. Para isso, eles votam em relação a uma série de quesitos. Somente depois disso, com base na decisão dos jurados, o juiz apresenta a sentença. Em caso de condenação, cabe ao magistrado fixar a pena que deve ser cumprida – a dosimetria não é realizada pelos jurados.
O que dizem as defesas
A defesa de Yasmin não pretende pedir a absolvição da mãe pelo crime, pelo contrário. Segundo a advogada Thais Constantin, o intuito é permitir que os jurados analisem as provas periciais, que constam no processo, e que julguem a mãe com base nisso.
— Nossa bancada trabalhará para que o Conselho de Sentença decida por sua livre convicção, baseada no olhar crítico sobre cada prova que integra os autos. Da mesma forma, demonstrar que o conteúdo probatório se calçou na confissão de Yasmin, deixando de analisar a compatibilidade de suas declarações com as provas periciais formalizadas pelo Instituto-Geral de Perícias. Confiamos que, ao final deste julgamento, os jurados afastados da pressão social condenem Yasmin, na medida dos atos por ela efetivamente praticados — sustenta a defesa.
Responsável pela defesa de Bruna, o advogado Ueslei Boeira afirma que pretende demonstrar no plenário que a madrasta não foi a responsável direta pela morte do menino.
— É um processo extenso e que estamos buscando em cada detalhe trabalhar em uma defesa técnica e esclarecedora, dando voz a Bruna, para que o Conselho de Sentença possa julgar dentro da realidade dos fatos e conforme as provas que há processo, de acordo com suas consciências, e que possam decidir, caso entendam pela culpa ou inocência da Bruna. Portanto, buscaremos demonstrar que a Bruna não concorreu diretamente ao resultado. Esperamos que seja um julgamento justo e respeitoso para todas as partes — afirma o criminalista.