No último sábado (27), Débora Michels Rodrigues da Silva, 30 anos, deveria ter se mudado para o apartamento que havia escolhido alguns dias antes. A personal trainer estava em processo de separação de Alexsandro Gunsch, 48, com quem havia mantido relacionamento por 11 anos. A mudança, que não se concretizou, ficou somente nos planos e lembranças da família dela. Na última sexta-feira (26), o corpo da mulher foi encontrado na frente da casa dos pais, em Montenegro, no Vale do Caí. O companheiro confessou o crime e está preso de forma preventiva.
Dois dias antes de ser encontrada morta, Débora havia feito a vistoria no imóvel onde planejava recomeçar a vida. Na sexta-feira, a mãe pretendia ajudá-la a arrumar os últimos itens da mudança prevista para o dia seguinte. Mas nada disso aconteceu. Os pais despertaram naquela madrugada, com o movimento dos policiais militares e de vizinhos. O corpo de Débora havia sido deixado, sob um cobertor, em frente à moradia da família.
— A Débora era uma pessoa muito querida por todos aqui na comunidade. Amigos, família, todo mundo adorava ela. O pessoal da academia, que trabalhava com ela, adorava o sorriso dela, a alegria de trabalhar. Ela amava o que ela fazia. Ela gostava muito, e isso contagiava muito as pessoas, nós da família também. Era uma pessoa cativante, especial demais — descreve o irmão, Alex Michels, 41 anos.
Debby, como era conhecida, atuava como personal trainer desde 2011. Nas redes sociais, ela compartilhava dicas de treinos e rotina na academia. Formada em Educação Física pela Unisinos, trabalhava numa academia em Montenegro. Dedicada aos cuidados com o corpo, ela também chegou a vencer competições de fisiculturismo. Alexsandro também é fisiculturista.
— Quando ela estava na faculdade de Educação Física, ela dava instrução para ele na academia. Se conheceram lá, se relacionaram, se apaixonaram. Eles viviam 24 horas juntos. Trabalhavam na mesma academia havia anos — relata o pai de Débora, Davi Rodrigues da Silva, 71 anos.
Ao longo do período em que mantiveram o relacionamento, os familiares não chegaram a perceber qualquer tipo de abuso por parte do companheiro. Era comum o casal frequentar a casa dos parentes da personal trainer, especialmente aos fins de semana. O companheiro teria um comportamento um pouco mais reservado, segundo a família de Débora. Já a personal era mais extrovertida. Ao decidir se separar, ela não teria detalhado o motivo.
— Nós da família, amigos, só queremos justiça. Não está sendo fácil, principalmente para os meus pais. Está bem complicado — conta o irmão.
O pai de Débora relata que chegou a conversar com o companheiro da filha quando soube que ela pretendia se separar. O homem teria demonstrado que estava tudo resolvido entre eles e que, inclusive, iria auxiliar a personal a arrumar as coisas dela. Agora, a família acredita que ele não tenha aceitado o término da relação.
— Fui falar com ele, porque ele também é pai. Eu acreditei. E de noite ele fez essa barbaridade. Éramos uma família feliz. Agora destroçou tudo. Sempre fizemos o máximo pela nossa filha. Vamos tentar guardar a imagem bonita dela. Mas foi uma maldade sem tamanho. Uma atrocidade. Só peço que façam justiça, pelo amor de Deus. É uma dor tão grande. Não gostaria que ninguém passasse por isso — desabafa o pai.
A morte de Débora causou comoção no município, onde chegou a ser realizado um protesto. A cerimônia de despedida de Débora ocorreu em uma capela de funerária da cidade. Por volta das 11h de sábado, o corpo foi levado para o Cemitério Municipal de Montenegro, onde foi realizado o enterro.
Ouça a entrevista do irmão ao Timeline
Sem registros anteriores
Diretora da Divisão de Comunicação Social da Polícia Civil, a delegada Eliana Parahyba Lopes também confirmou em entrevista ao Gaúcha Atualidade que Débora estava em processo de separação. Sobre o crime, a polícia identificou o veículo do companheiro de Débora, usado para transportar o corpo dela naquela madrugada, por meio de imagens de câmera. O corpo da vítima foi deixado sob um cobertor em frente a casa dos pais dela, no bairro Centenário.
— Ele simplesmente despejou o corpo dessa vítima na frente da residência dos pais. Não só descartou o celular, mas também o corpo da vítima. A Polícia Civil está tratando o caso como feminicídio, era um companheiro dela, com o qual ela vivia havia 11 anos — disse a delegada.
Gunsch foi ouvido pela polícia e alegou que, durante uma briga, ele e Débora teriam trocado agressões. O homem afirmou ter pego a companheira pelo pescoço, levantado e arremessado contra um guarda-roupas. Neste momento, ela teria começado a passar mal. O investigado relatou à Polícia Civil que, na sequência, colocou Débora no carro e, no deslocamento, percebeu que ela já estava morta. O homem disse então ter ficado desesperado com a situação e decidido deixar o corpo em frente à casa dos pais dela.
A versão do preso é averiguada pela Polícia Civil, que aguarda o laudo pericial para saber o que provocou a morte da vítima. A polícia já havia solicitado a prisão preventiva dele, mas, na ocasião o pedido não foi concedido pela Justiça, que entendeu que não havia elementos suficientes para a medida. Depois disso, a Polícia Civil fez pedido de reconsideração da prisão, com parecer favorável do Ministério Público. Desta vez, o Judiciário decretou a prisão do autor confesso. Gunsch foi detido no domingo.
Conforme a policial, não havia ocorrência da vítima relatando qualquer tipo de violência doméstica por parte do companheiro e ela nunca havia solicitado medida protetiva. Em 2023, segundo a Polícia Civil, 87,7% das vítimas de feminicídio não tinham obtido medida protetiva e 71% nem sequer tinham registrado alguma ocorrência anterior contra o agressor.
— É importante a gente dizer para as mulheres não se calarem, para buscarem ajuda. A única forma de a gente quebrar esse ciclo de violência é denunciando. A gente tem uma rede de proteção bem estruturada e pronta para acolher e orientar essas mulheres, que são vítimas de violência moral, patrimonial, sexual e física. A única forma de parar esses homens agressores é as autoridades fazendo alguma coisa, porque eles jamais vão parar — disse a delegada.
GZH tenta contato com a defesa do investigado.
Como pedir ajuda
Brigada Militar – 190
- Se a violência estiver acontecendo, a vítima ou qualquer outra pessoa deve ligar imediatamente para o 190. O atendimento é 24 horas em todo o Estado.
Polícia Civil
- Se a violência já aconteceu, a vítima deverá ir, preferencialmente à Delegacia da Mulher, onde houver, ou a qualquer Delegacia de Polícia para fazer o boletim de ocorrência e solicitar as medidas protetivas.
- Em Porto Alegre, a Delegacia da Mulher na Rua Professor Freitas e Castro, junto ao Palácio da Polícia, no bairro Azenha. Os telefones são (51) 3288-2173 ou 3288-2327 ou 3288-2172 ou 197 (emergências).
- As ocorrências também podem ser registradas em outras delegacias. Há DPs especializadas no Estado. Confira a lista neste link.
Delegacia Online
- É possível registrar o fato pela Delegacia Online, sem ter que ir até a delegacia, o que também facilita a solicitação de medidas protetivas de urgência.
Central de Atendimento à Mulher 24 Horas – Disque 180
- Recebe denúncias ou relatos de violência contra a mulher, reclamações sobre os serviços de rede, orienta sobre direitos e acerca dos locais onde a vítima pode receber atendimento. A denúncia será investigada e a vítima receberá atendimento necessário, inclusive medidas protetivas, se for o caso. A denúncia pode ser anônima. A Central funciona diariamente, 24 horas, e pode ser acionada de qualquer lugar do Brasil.
Defensoria Pública – Disque 0800-644-5556
- Para orientação quanto aos seus direitos e deveres, a vítima poderá procurar a Defensoria Pública, na sua cidade ou, se for o caso, consultar advogado(a).
Centros de Referência de Atendimento à Mulher
- Espaços de acolhimento/atendimento psicológico e social, orientação e encaminhamento jurídico à mulher em situação de violência.