Buscando realizar o sonho da casa própria, a vendedora autônoma Helen Tais Raimundo, e seu marido, o conferente de almoxarifado Marcelo dos Santos de Mello, adquiriram um terreno no Loteamento Província de São Pedro, no bairro Olaria, em Canoas. Em julho de 2021, eles assinaram os contratos da compra do terreno e da construção do imóvel. Mas a residência nunca foi finalizada. Eles estimam prejuízo de R$ 70 mil.
— O sonho da minha filha mais nova era ter o quartinho dela. Até hoje ela me pergunta: "Mamãe, quando vamos ter aquela casa com o quarto rosa que você prometeu?" — conta a vendedora.
A situação vivida pela família de Helen se repete com pelo menos outros três vizinhos. Eles registraram ocorrência na Polícia Civil, que investigou o caso. Na primeira semana de novembro, a 3ª Delegacia de Polícia de Canoas indiciou por associação criminosa e estelionato o empresário Adão Volnei Menger Rickrot, proprietário da Torres Construtora, e os corretores Isaac Kerber de Aguiar e Fernanda de Mattos Soares.
Segundo a polícia, o inquérito investigou quatro casos de quebras contratuais que foram identificados como estelionatos e resultaram em prejuízo de R$ 200 mil às vítimas.
Segundo o relato dos compradores, a negociação se daria da seguinte forma:
- Os corretores negociariam com os clientes terrenos no loteamento. A venda era finalizada normalmente
- Na hora de assinar o contrato, os corretores induziriam os clientes a fechar negócio também com uma construtora da confiança deles, a Torres, para fazer a obra da casa
- A construtora atrasaria o início da obra, que evoluiria lentamente. Quando os clientes passavam a cobrar pela demora, os investigados começariam a evitar os contratantes
- Os corretores aconselhariam os clientes a não cobrarem a construtora e serem pacientes, caso contrário, a obra poderia ser feita "de qualquer jeito"
- O construtor deixava de responder os contatos dos contratantes, deixando a obra inacabada.
Helen conta que a obra da casa se iniciou com atraso — perto da data na qual deveria estar finalizada. Ela diz que o responsável pela construtora teria repetidas vezes fugido das cobranças.
Conforme a vendedora, em janeiro de 2023, ele parou de responder suas mensagens e bloqueou a família nas redes sociais:
— Até aí a gente já tinha feito dois empréstimos e vendido o nosso carro. Acabei saindo do serviço e peguei toda minha rescisão para pagar o dono da construtora.
"Sonho acabou se tornando um pesadelo", conta cliente
Buscando por ajuda, a família criou um grupo nas redes sociais que reuniu cerca de 20 clientes da empresa que dizem ter passado pela mesma situação. Segundo eles, existem vítimas que optaram por não prestar queixa na polícia.
Entre os membros do grupo, estão a técnica administrativa Luana da Silva Kiefer, e o marido, o auxiliar de serviços hidráulicos Leonardo de Lima Santana. Eles estimam que tiveram prejuízo de mais de R$ 30 mil.
— A gente queria sair de onde a gente morava porque o lugar não era nosso, e o sonho acabou se tornando um pesadelo — conta Luana.
Ela conta que eles acabaram optando por terminar a obra sozinhos:
— Não tínhamos dinheiro para pagar tudo, então o que deu fizemos com as nossas próprias mãos. Foi desesperador porque a gente não tinha experiência com construção e estávamos sem dinheiro e sem instrução nenhuma.
No caso da enfermeira Glória Maria Cardoso Monteiro, e do seu namorado, o técnico da segurança do trabalho Patrick Kunzler, a obra nem sequer foi iniciada.
— Nos balançou muito. Mexeu com as nossas famílias. A gente passou a consultar com psiquiatra e psicólogo. Estamos tomando remédios porque foi insuportável aguentar todo esse processo que a gente passou — disse Patrick, que afirma que o prejuízo do casal passa de R$ 45 mil.
Polícia alerta para importância do boletim de ocorrência
Segundo a assessoria de comunicação da Polícia Civil de Canoas, os indiciados afirmaram, em depoimento, que o que aconteceu foi um desacerto comercial e que eles não teriam intenção de benefício próprio.
Segundo a Polícia Civil, fazer o registro é essencial para o combate desse tipo de crime. A assessoria ressalta que "só a partir do boletim de ocorrência consegue investigar e impedir que outras pessoas caiam no mesmo golpe".
Contrapontos
GZH contatou os corretores Isaac e Fernanda, que afirmaram que não iriam se manifestar.
A reportagem tentou contato com o empresário Adão Volnei desde a última quarta-feira (8), mas até a publicação desta matéria não conseguiu retorno.
* Produção: Camila Mendes