Em 15 de julho de 2011, a chamada Lei dos Trotes (n. 13.759) foi aprovada na Assembleia Legislativa, prevendo uma punição a quem ocupasse a linha de serviços de emergência com informações erradas e fazendo com que equipes da Brigada Militar ou Bombeiros fossem deslocadas para ocorrências que não existiam.
A ideia era promissora, mas 12 anos depois, a legislação ainda não foi regulamentada pelo governo do Estado. Após a gestão de Tarso Genro (2011-2015), a lei ainda passou pelos governos de José Ivo Sartori, do MDB, (2015 - 2019), e depois Eduardo Leite, do PSDB (2019 até agora, somado ao período de Ranolfo Vieira Júnior em 2022). Em resposta à reportagem, a Secretaria de Segurança Pública confirmou, nesta terça-feira (11), que a atual gestão já está trabalhando pela regulamentação da lei e promete ter novidades em breve.
De autoria do deputado Carlos Gomes (na época do PRB), a proposta era de que o infrator arcasse com os prejuízos causados pela chamada falsa.
— A motivação foram os prejuízos causados por várias ligações de trotes, prejuízos financeiros e de vida, principalmente. Lembro que, quando apresentamos esse projeto, tinha noticiário de pessoas que perderam a vida, porque o socorro demorou a chegar porque tinha ido para o outro lado da cidade para atender trote — comenta Gomes, hoje deputado federal pelo Republicanos.
O texto original exigia a cobrança na fatura de serviços telefônicos por despesas decorrentes do acionamento indevido dos serviços de atendimento a emergências, e uma lei complementar (n. 14.149) em 2012 mudou a redação especificando o ressarcimento no formato de multa.
— Teve um levantamento à época de que o Centro Integrado de Operações da Segurança Pública (Ciosp) registrava 23% de todas as ligações como trote. Naquele período, só o Rio Grande do Sul tinha um prejuízo de R$ 225 mil mensais por causa dos trotes para a BM. Porque aí tu movimentas todo o efetivo, tem o combustível, tem o gasto em viatura. Então o prejuízo é grande em todas as formas — afirma Gomes.
O deputado explica que, após a sanção da lei, o poder público deveria calcular os prejuízos de cada ligação e criar um mecanismo para o ressarcimento aos cofres públicos. De acordo com Gomes, o governo (que na ocasião era o de Tarso Genro, do PT) encontrou dificuldade de regulamentar e quantificar quanto custaria cada trote.
A reportagem da Gaúcha pediu ao Estado um levantamento do número de trotes aplicados aos longo dos 12 anos após a legislação, mas a Brigada Militar alegou que os dados precisariam de uma pesquisa avançada, que demanda tempo, e que nem todos os municípios têm condições de contabilizar os trotes.
Mais de 15 mil trotes em seis meses na Capital
Em Porto Alegre, o Centro de Operações Policiais Militares (Copom) grava ligações e consegue ter um cenário atual dos prejuízos. Segundo um levantamento do Comando de Policiamento da Capital (CPC), de janeiro a junho deste ano, das 274.728 ligações recebidas pelo serviço de emergência, 15.360 foram trotes e 15.033 foram engano (o que corresponde a 11% do total).
Houve ainda 24.368 que desligaram (8,86%), 76.398 que deixaram a ligação no mudo e não falaram (27,8%). Apenas 48.534, ou seja, 17,6%, pediram algum tipo de informação.
O Comandante do CPC, coronel Luciano Moritz, salienta que houve um aumento dos trotes após a pandemia. Segundo ele, nos anos mais severos da covid-19, a média mensal era de mil a 1,2 mil ligações de trotes na Capital. Com a melhora nos casos, o número subiu para cerca de 2 mil chamadas deste tipo.
— É tudo o que se possa imaginar. E também o que acaba comprometendo o atendimento e emergência são pessoas ligando e pedindo informações das mais variadas, desde localização de bairro, até pontos turísticos da cidade — salienta Moritz.
O comandante explica que a inteligência consegue fazer o rastreamento de ligações e identificar o autor para responsabilizá-lo na forma criminal.
— Tem que ser feita uma investigação. Nós temos no Código Penal, com os artigos 339 e o 340. Um deles é a denunciação caluniosa e o outro a falsa comunicação de crime. Mas claro, não é tão ágil como uma multa — compara.
O que diz o Código Penal
Decreto Lei nº 2.848 de 07 de Dezembro de 1940
Art. 339. Dar causa à instauração de inquérito policial, de procedimento investigatório criminal, de processo judicial, de processo administrativo disciplinar, de inquérito civil ou de ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime, infração ético-disciplinar ou ato ímprobo de que o sabe inocente: (Redação dada pela Lei nº 14.110, de 2020)
Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.
§ 1º - A pena é aumentada de sexta parte, se o agente se serve de anonimato ou de nome suposto.
§ 2º - A pena é diminuída de metade, se a imputação é de prática de contravenção.
Art. 340. Provocar a ação de autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de crime ou de contravenção que sabe não se ter verificado:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.