Há oito dias, a Polícia Civil deflagrou a Operação Xerxes, que investiga extorsões, organização criminosa e lavagem de dinheiro. Quatro empresários estão entre os suspeitos e foram presos: os irmãos Erick, Allan e Nicholas Berkai Fernandes — sócios da rede de barbearias El Cartel — e o dono de restaurante Guilherme Barbosa Altieri.
A Delegacia de Combate à Lavagem de Dinheiro, responsável pela investigação, aponta que as empresas eram usadas por uma célula de uma facção criminosa para "esquentar" recursos extorquidos de famílias pobres de Viamão e também o lucro do tráfico de drogas.
Os quatro empresários seguem presos e ainda não prestaram depoimento. A polícia está concluindo nesta sexta-feira (2) o inquérito sobre extorsões e organização criminosa, mas o que trata da lavagem de dinheiro ainda está em andamento.
GZH falou com o advogado Daniel Escalona Garcia, que defende o principal sócio da El Cartel, Erick, e o empresário Guilherme. Ele nega a existência de provas que vinculem os clientes dele a criminosos. Nesta sexta, o advogado fez pedido de relaxamento de prisão dos dois clientes.
Leia trechos da entrevista:
O que o senhor pode dizer sobre as suspeitas contra sócios da rede El Cartel Fernandes?
Não há nenhuma vinculação de Erick Berkai Fernandes com essa quadrilha, com esse grupo criminoso lá de Viamão. Nós não encontramos nenhum nexo de causalidade entre a família Berkai e os traficantes, esses ditos associados deles. Eles nem conhecem os traficantes, não conhecem ninguém dos nomes relacionados no inquérito, nenhum dos meus clientes conhece. Nem o Erick, nem os irmãos dele.
O senhor teve acesso aos inquéritos?
Estamos acessando todo o inquérito e todos os documentos que levaram à conclusão do delegado dessa organização criminosa vinculando os meus clientes a esse pessoal lá de Viamão. Pelos documentos, são mais de 5 mil páginas, não existe nenhum nexo de causalidade entre a conduta dos nossos clientes e esse grupo. Estou trabalhando no inquérito da lavagem e a única relação que existe foi um depósito feito por engano por um dos membros da quadrilha, que nem se sabe, foi uma conversa telefônica.
Havia transações da conta de Guilherme Barbosa Altieri, que também foi preso, para contas do Erick e das barbearia?
Não há vinculação (com traficantes) dos meus clientes Erick e o Guilherme. Guilherme é dono do restaurante contratado pelo Erick para fazer a gestão financeira das barbearias. Como a barbearia não tinha as máquinas e o Guilherme tinha as máquinas de cartão para receber os pagamentos, todos os pagamentos na barbearia eram feitos através das máquinas do Guilherme, isso é inegável. O nexo de causalidade entre as barbearias e os traficantes não existe.
Por que Guilherme fazia a gestão financeira das barbearias? É contador?
Ele tem curso superior, não é contador. Foi usado pelo Erick porque tem as máquinas.
Por que Erick não tinha suas próprias máquinas de pagamento com cartão?
Agora já tem. Na época da investigação, a barbearia estava crescendo muito rápido, tinha que abrir a loja, até vir a máquina, usava a do Guilherme, para depois regularizar.
Qual relação do Erick e do Guilherme?
São amigos desde pequenos, muito próximos. O Guilherme é como se fosse uma pessoa da família Berkai. É querido por todos.
A investigação aponta que haveria ligação direta entre um dos traficantes investigados e uma das contas bancárias de Guilherme.
Não. A polícia divulgou que Jackson Benedick (preso por tráfico, também alvo da operação) movimentaria contas de Guilherme. Se movimentou, Guilherme não tem conhecimento disso. No entendimento da defesa, a investigação está equivocada. A movimentação toda é muito familiar, é uma empresa familiar, afinal, são três irmãos, por isso, vai dinheiro de uma conta para outra. Isso tudo vamos esclarecer no processo.
Os pais deles também são do ramo.
Sim. Quando pai se aposentou, os filhos assumiram. O negócio cresceu muito de 2020 para cá, abriram várias filiais, têm investidores. Cada filial tem um sócio investidor. Tem muita gente honesta aí no meio dessa história que teve bens apreendidos e que não tem nenhuma relação com o tráfico ou outra atividade ilícita.
Erick divulga nas redes uma imagem de bem-sucedido, um barbeiro que podia comprar um Porsche.
O Porsche nós explicamos a aquisição com muita facilidade. Foram três sócios das barbearias que investiram, depositaram altas quantias na conta do Erick para juntar o dinheiro e comprar o Porsche para ser revendido depois. O Porsche está registrado em nome do Erick no Detran.
Por que os sócios deram dinheiro para ele comprar?
Porque ele não tinha a totalidade. Era R$ 1,2 milhão. Ele só tinha R$ 200 mil. Cada sócio colocou R$ 500 mil. Essa questão do Porsche é importante porque para a polícia é um símbolo da lavagem de dinheiro. Se você se inscreve na Porsche e fica na fila de espera, quando chega o veículo, se tu não exerce a compra no teu nome, não pode ser transferido para outra pessoa e tu perde a vez na fila. Como tem fila de espera, o que as pessoas fazem, se inscrevem e, se não têm dinheiro, dão um jeito de financiar, porque depois esse veículo é vendido por valor mais alto, com ágio. Por isso Erick estava na fila, ele tinha revenda, negócios de automóveis, quando chegou a vez dele, ele só tinha R$ 200 mil, chamou os dois sócios. Ele não rodou 2 mil quilômetros com esse carro.
Se ele não tinha dinheiro como barbeiro para ter o Porsche, por que se inscreveu?
Ele tinha interesse. Ele é revendedor de automóvel.
Ele tem loja de compra e venda de automóveis?
Não tem loja. Ele compra e vende veículo de alto valor. Cada vez que ele compra um carro de alto valor, ele faz um vídeo para atrair clientes para a barbearia. Ele promove aquilo. Mas não é uma coisa de ostentação porque ele é milionário.
Mas ele usava como propaganda o fato de ser barbeiro e conseguir ter um Porsche.
Exatamente. Porque isso atraía outras pessoas para fazer os cursos que ele promovia, para serem barbeiros nas redes dele. Era um atrativo para que as pessoas se interessassem pela profissão. Eu sei que é difícil para as pessoas entenderem que um barbeiro que corta cabelo a R$ 25 pode ter um Porsche. Estou explicando a situação: o Porsche era para ser revendido e será revendido, tão logo seja liberado (o carro foi apreendido pela polícia). Essa associação a esse luxo que o Erick tem que o delegado associou ao tráfico, mas é equivocado.
O Erick usa a compra do Porsche como propaganda. Isso não é enganar as pessoas? Pelo que o senhor explica, ele, como barbeiro, não tinha dinheiro para comprar um Porsche, o trabalho nas barbearias não deu isso a ele.
Cada barbearia dele movimenta, em média mensal, entre R$ 50 e R$ 75 mil mensais. São 10 barbearias, dá R$ 750 mil por mês. Multiplica isso ao longo do período da investigação, de 2020 a 2023, é o valor movimentado que o delegado diz que é do tráfico, mas não é. É uma conta simples de explicar. A gente quer acesso à autoridade policial para poder explicar e auxiliar na investigação. Nós temos três irmãos e mais o Guilherme presos injustamente. Eles estão presos injustamente.
O senhor acredita que não há elementos na investigação contra seus clientes?
Me mostra um e-mail do Erick com os traficantes ou algum membro da facção. Me mostra uma transferência bancária entre o Erick ou o próprio Guilherme e a facção, me mostra uma ligação telefônica entre eles. Eles tiveram os telefones grampeados todo esse período e não tem nada de vinculação direta deles com essa gente. Temos um monte de bens apreendidos injustamente, quatro pessoas presas injustamente.
As barbearias seguem funcionando?
Sim, estão operando. Os barbeiros estão lá. Se fosse lavagem de dinheiro, todo mundo tinha debandado. Quem vai trabalhar sabendo que o chefe é traficante? Mas estão funcionando normalmente.
O senhor já conseguiu falar com seus clientes, como eles estão?
Tenho falado diariamente. Hoje (na quinta-feira, 1º), é o aniversário do Erick. Eles são convictos de que não têm nenhuma vinculação com o crime organizado. Eu propus para eles que poderiam delatar e ter benefícios com a delação. Eles disseram: "Não temos o que delatar, não conhecemos ninguém".
Seus clientes estão com bens e contas bloqueados?
Tudo bloqueado. As barbearias tiveram as máquinas de pagamento com cartão recolhidas.
Como estão recebendo?
Em dinheiro, nas contas dos barbeiros. Os proprietários das lojas têm nos ligado pedindo que a gente entregue o ponto. Olha a repercussão disso.
Essas máquinas apreendidas nas barbearias são do Erick e não mais do Guilherme?
É o que me informam (os clientes).
O senhor impetrou habeas corpus?
Sim, em favor de Erick e Guilherme. A liminar foi indeferida pelo Tribunal de Justiça. Agora, vamos analisar toda essa documentação, apontar, até para colaborar com a investigação, onde foi o equívoco da polícia. Eles querem trabalhar. Esses rapazes chegam às 9h e saem às 21h das barbearias, isso já foi apurado pela polícia. Eu não entendo por que essas pessoas estão presas.