O grupo criminoso que teria feito ao menos 80 vítimas em 12 Estados aplicando o golpe dos nudes, e que foi alvo de operação nesta segunda-feira (29), tem dois diferenciais em relação a outras quadrilhas especializadas no mesmo tipo de delito, segundo a investigação do Departamento de Investigações do Narcotráfico (Denarc): além de ter aliciado uma adolescente para fornecer fotos íntimas, eles selecionavam potenciais vítimas por meio de sites que fornecem dados pessoais.
Em relação ao primeiro ponto, o Denarc explica que, em geral, as quadrilhas selecionam fotos que encontram na internet para enviar às pessoas alvo da extorsão. O golpe consiste em contatar as vítimas — em geral homens de mais idade, muitas vezes casados —, por meio de redes sociais, se passando por uma mulher jovem, trocar fotos íntimas e depois ameaçar tornar os diálogos públicos (saiba mais abaixo e no vídeo acima).
As vítimas, no caso deste grupo investigado, não seriam selecionadas aleatoriamente em redes sociais, embora fossem contatadas por este meio. Segundo a Polícia Civil, os golpistas encontravam potenciais alvos principalmente por meio de sites de buscas que permitem, mediante cadastro, fazer consultas de dados cadastrais completos de qualquer pessoa.
O responsável pelo caso é o delegado Rafael Liedtke, da 2ª Delegacia do Denarc. Ele diz que os investigados são traficantes que migraram para os crimes de extorsão e estelionato na modalidade virtual.
O dinheiro obtido seria usado para capitalizar o narcotráfico, permitindo a compra de mais drogas, armas e munição. Parte dos recursos também seria lavada, por meio de depósitos em contas bancárias de laranjas e aquisição de bens.
— Ainda estou vendo como vou proceder sobre esta questão do site de busca, se existe algum artigo no Código Penal sobre esta exposição de dados pessoais, pelo menos sobre ter mais cuidado para quem disponibiliza ou, então, como as pessoas podem, uma por uma e conforme seu interesse, manter mais em sigilo os seus dados ou até buscar alguma forma legal contra esta exposição de informações cadastrais — diz o delegado.
Liedtke investiga vários pagamentos feitos pelos integrantes da facção a uma adolescente de 17 anos, moradora de Sapiranga, no Vale do Sinos. Ela recebia até R$ 200 pelo que os criminosos chamavam de "pacote" de imagens íntimas.
O delegado diz que a adolescente foi aliciado pelo grupo, com o qual manteve contato, atuando quase como uma integrante da quadrilha, com repasses recorrentes de fotos e vídeos que eram usados nos golpes. Por isso, ela pode ser responsabilizada ao final do inquérito.
A investigação, que se estendeu por 11 meses, teve acesso a trocas de mensagens de texto, áudio e imagens que servirão como provas da prática criminosa. Segundo o delegado Liedtke, os materiais serão base do indiciamento de 41 suspeitos e mostram que o grupo tinha preferência por vítimas acima dos 50 anos, com boa qualidade de vida — muitas vezes médicos, empresários e políticos, embora agricultores tenham sido identificados entre os alvos do golpe.
As trocas de mensagens a que a investigação teve acesso mostram que as vítimas pensavam estar conversando com uma adolescente. As fotos enviadas eram da adolescente de Sapiranga, mas os textos eram escritos por integrantes da quadrilha.
"Sou um bebê"
Segundo a investigação do Denarc, havia uma mulher, integrante do grupo, que se passava por adolescente para gravar áudios, que eram enviados às vítimas. Agentes ainda trabalham para identificá-la.
Em um dos arquivos, obtido pela polícia, ela diz ter 15 anos e gostar de "homens mais velhos", além de sugerir a troca de fotos íntimas. Ouça abaixo (a voz foi distorcida):
Outro áudio obtido pela investigação foi enviado de um golpista para outro. Ele fala sobre uma potencial vítima, um homem que pensa estar falando com uma mulher jovem, mas está trocando mensagens com um presidiário:
Em mais uma mensagem de áudio interceptada, um dos criminosos informa a outro sobre o iminente pagamento de R$ 63 mil por uma vítima. Isto teria ocorrido já na segunda parte do golpe, quando os golpistas se passam por autoridades e pedem dinheiro para evitar que os diálogos do homem com uma suposta adolescente se tornem públicos ou sejam tema de inquérito policial.
Vereador entre as vítimas
Outra mensagem anexada ao inquérito e divulgada pela polícia é de uma vítima. Um homem, que seria um vereador, confirma que fez um depósito de R$ 5 mil. Ele se refere ao interlocutor como "doutor", porque acredita estar falando com um advogado. O Denarc não divulga de qual cidade é o político, para evitar expor a vítima, mas confirma que ele não é do Rio Grande do Sul. Ouça o áudio (a voz foi distorcida):
Há, ainda, a gravação de um agricultor que diz ter pedido dinheiro ao patrão para pagar o valor cobrado, como forma de evitar que a família da suposta adolescente o processasse pela troca de fotos íntimas com ela. A voz da vítima também foi distorcida.
Operação
Na operação policial realizada nesta quarta, 150 agentes gaúchos e catarinenses cumpriram 41 mandados de prisão, 30 de busca, dois de sequestro judicial de veículos e 25 bloqueios de contas bancárias nas seguintes cidades: Porto Alegre, Alvorada, Viamão, Gravataí, Cachoeirinha, Canoas, Tramandaí e Imbé, no Rio Grande do Sul, além de Florianópolis, Joinville e São Cristóvão do Sul, em Santa Catarina.
Foram identificadas 80 vítimas em 12 Estados: principalmente de Santa Catarina, mas também Espírito Santo, Goiás, Minas Gerais, São Paulo, Amazonas, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Paraná, Mato Grosso e Rio Grande do Sul.
O delegado Liedtke explica que o grupo investigado neste caso, além da extorsão, responde por corrupção de menores, por ter aliciado a adolescente. Este crime tem pena prevista de até quatro anos de prisão. A polícia também investiga os mesmos suspeitos pelos delitos de organização criminosa, tráfico de drogas, lavagem de dinheiro e porte ilegal de arma. Somadas, as penas máximas chegam a mais de 50 anos de prisão, em caso de condenação.
Como não cair no golpe dos nudes:
- Evite iniciar conversas por meio de aplicativos de mensagens com perfis desconhecidos
- Desconfie também de solicitações de amizades nas redes sociais
- Não troque fotografias, que possam ter conotação íntima, por meio de aplicativos, como WhatsApp ou Messenger.
- Evite conversas por meio de aplicativos com prefixo telefônico desconhecido.
- Não faça depósitos, transferências ou pagamentos para desconhecidos.
- Se for vítima de algum golpe ou de tentativa de abordagem desse tipo, procure a polícia e registre ocorrência.
- Lembre-se: pedofilia é crime!
Fonte: Polícia Civil