Por Nilton Mullet Pereira
Docente da área de ensino de História na UFRGS
Os contínuos ataques a escolas, que tiveram como divisor de águas os eventos tristes de Columbine (EUA), em 1999, parecem estar se tornando mais frequentes, e até rotineiros, no Brasil. Essa situação tem nos levado a buscar respostas, mas precisamos entender que as respostas que buscamos, para essas e outras aflições que atingem nosso mundo, não estão ao nosso alcance apenas através dos modelos de pensamento que estamos habituados a utilizar, modelos esses que criaram formas de relações entre os seres fundadas pela colonialidade dos saberes e dos poderes e baseados em modos de ver o mundo vindos da Europa, através do estudo de autores e filósofos europeus.
A premissa desta argumentação que faço envolve conhecer a complexidade da escola e poder aprender a escutar as infinitas vozes do mundo. Logo, precisamos aprender mais sobre os outros, para poder olhar para nós mesmos, de modo que esse olhar não continue a ser narcísico e egoísta, como de costume é.
O que me parece apressado e perigosamente baseado em opiniões comuns são duas respostas que têm se repetido na profusão de discursos que lemos e escutamos sobre violência e escola, nas últimas semanas, especialmente depois do terrível ataque de um homem a uma escola infantil, em Blumenau (SC).
A primeira é supor que a resposta, diante do desespero da situação que se apresentou, é armar seguranças e policiar as escolas. Não se pode imaginar que uma ação policial vá resolver um problema que não é apenas da escola, mas da sociedade como um todo. Além do mais, essa se trata de uma questão potencialmente agravada, nos últimos anos, por uma cultura de violência com a qual estamos, infelizmente, aprendendo a nos acostumar.
O culto às armas talvez seja o elemento central de todo esse processo. As concessões feitas pelo governo federal anterior à compra e ao uso de armas e a simbologia da imagem de uma criança fazendo o gesto de uma arma são sintomáticos de uma vulgarização e uma naturalização da violência e da resposta armada a qualquer situação.
Uma angústia, um “não”, uma perda leva a uma imediata resposta violenta e, na maior parte das vezes, armada.
A segunda resposta amplamente divulgada é atribuir à escola, e a sua suposta ineficácia, a culpa pelas situações amargas que significam os frequentes ataques a escolas no Brasil. Casos que deixam a todos consternados e preocupados, e dos quais, mais uma vez, a escola parece ser o alvo. Nesse movimento de culpabilização, sobretudo da escola pública, aparecem pessoas e organizações privadas, estranhas à pesquisa em educação e à escola, apresentando soluções mágicas para a educação brasileira, como se esta estivesse constantemente em crise.
Ao que me parece, o que devemos fazer é nos perguntar se a escola não tem contribuído decisivamente, há muito tempo, para diminuir os números da violência em nosso país? Por que ao celebrar a diminuição nas estatísticas sobre a violência, falamos apenas na polícia e esquecemos da escola? Justamente por estarmos envolvidos nessa cultura de violência a resposta tem sido sempre as armas, e nunca a educação.
Sim, a solução e a resposta estão na escola, com todos os problemas que ela, certamente, ainda carrega. As escolas brasileiras permitem um espaço de vida, de sociabilidade, de alimentação, para milhares e milhares de crianças e jovens. Elas são o lugar da multiplicidade.
Nelas, os jovens vivem suas singularidades, aprendem sobre a complexidade da realidade, e fora em função das experiências que tiveram na escola que muitos deles foram “desviados” do caminho da violência.
É na escola que podemos aprender sobre outros mundos, outros povos, outras formas de sonhar e de compreender a vida. É nela que os jovens convivem com a pluralidade dos modos de vida que existem em nosso país. E é nela que podemos também buscar e investigar os problemas da violência, mas não apenas através dos modelos eurocêntricos com os quais estamos acostumados.
Quem sabe os valores civilizatórios afro-brasileiros não possam indicar que a ludicidade ou o comunitarismo nos ensinam a ser menos narcisistas? Quem sabe possamos aprender sobre as nossas relações observando e, pacientemente, aprendendo com as filosofias dos povos amazônicos, não apenas em suas relações com a natureza, mas nas relações entre todos os seres?
A resposta, portanto, não é o medo, mas o cuidado; não são as armas, mas o amor; não é a crítica vaga, mas o investimento na vida das professoras, de professores, de servidores e da administração escolar, agentes da escuta e do acolhimento.