Na manhã da última segunda-feira (24), um caminhão cruzava a BR-470, em Veranópolis, na Serra, quando foi interceptado pela Polícia Rodoviária Federal (PRF). O motorista acompanhava dois outros veículos, que também foram abordados pelos agentes. Foi assim que os policiais descobriram uma carga de 75 mil maços de cigarros contrabandeados escondida dentro do caminhão. Esta foi a mais recente apreensão desse tipo realizada nas rodovias federais no Estado. O ano de 2022 registra aumento de 17,8% no volume de cargas de cigarros ilegais localizadas pela PRF no Rio Grande do Sul.
De 1º de janeiro a 25 de outubro deste ano, foram apreendidos nas vias federais do Estado 3.438.195 maços de cigarros que chegaram ao país de forma ilegal. A média atual é de 11,5 mil maços apreendidos por dia. No mesmo período do ano passado, tinham sido 2.916.484 maços, ou seja, houve crescimento no período. Chefe da comunicação da PRF no RS, Douglas Paveck Bomfim acredita que as estratégias empregadas pela inteligência do órgão estão por trás desse acréscimo na localização dos ilícitos.
— Acredito que decorreu do nosso uso da inteligência, de um amadurecimento da inteligência da PRF. Hoje, a polícia conta com um setor de inteligência robusto, e conseguimos cada vez mais combater a criminalidade como um todo — afirma.
No caso da apreensão realizada em Veranópolis, além de abordar o caminhão, os policiais interceptaram outros veículos, que estariam sendo usados como batedores, responsáveis por tentar fazer com que a carga não caísse em alguma barreira. A estratégia dos bandidos, neste caso, não deu certo e foi descoberta pelos agentes. O próprio motorista do caminhão relatou aos policiais que havia recebido como orientação acompanhar os outros dois carros, uma Montana, de Maximiliano de Almeida, e uma T-Cross, de Sananduva, para chegar ao destino final do carregamento, que seria na Serra.
Neste caso, o caminhão havia partido do Paraná, com destino ao Rio Grande do Sul. As maiores apreensões realizadas pela PRF no Estado ocorrem justamente nas rodovias federais que vêm das regiões Norte e Noroeste com objetivo de chegar a Grande Porto Alegre. Elo entre Iraí, na divisa com Santa Catarina, e Canoas, na Região Metropolitana, a BR-386, a chamada estrada da produção, está entre as que concentram as maiores apreensões de cigarros contrabandeados no Estado pela PRF — característica que se repete no tráfico de maconha.
Outras vias bastante usadas são a BR-285, que passa pela região de Santo Ângelo, Ijuí e São Borja, e a BR-101, via que também dá acesso a Santa Catarina e ao Litoral Norte. No caso da BR-101, não é incomum que as apreensões da PRF ocorram ainda em solo catarinense. Em abril deste ano, um carregamento de 125 mil maços foi encontrado no município de Biguaçu, em Santa Catarina. Neste caso, o motorista admitiu que havia recebido para fazer o transporte de Cascavel, no Paraná, até Porto Alegre. A Região Metropolitana é o destino principal dos carregamentos que chegam ao Estado, embora o produto seja enviado e revendidos em todas as regiões.
Ainda que o destino varie, os cigarros contrabandeados que chegam ao RS têm a mesma origem: o Paraguai (há uma parcela menor produzida de forma ilegal em fábricas brasileiras clandestinas). No país vizinho, os cigarros são adquiridos pelos grupos por valores bem abaixo do praticado pelo mercado legal. De lá, para chegar ao RS, as cargas podem ingressar diretamente no Brasil, pelas fronteiras com Paraná e Mato Grosso do Sul, ou passar por rotas utilizando o território argentino. Dali, são redistribuídas em novos carregamentos e seguem viagem.
Estratégias de transporte
Os veículos usados pelos grupos criminosos para fazer esse transporte dos cigarros adquiridos de forma ilegal variam. Por vezes, as cargas são encontradas no meio de outros produtos legalizados, sendo transportadas por caminhoneiros, que não possuem antecedentes criminais. São motoristas cooptados por grupos criminosos para fazer a entrega, já que apresentam menor chance de despertar a atenção das polícias e serem descobertos. Ainda assim, há diversos casos nos quais os agentes encontram os produtos clandestinos.
No fim de setembro, 300 mil maços de cigarros foram localizados sob fina camada de milho, dentro de uma carreta abordada em Venâncio Aires, no Vale do Rio Pardo. Os agentes tentaram inicialmente abordar o veículo na BR-386, mas o condutor só parou na RS-287. O motorista, que não tinha antecedentes, confirmou que a carga teria partido do Mato Grosso do Sul e tinha como destino o município de Morro Reuter.
Mas as quadrilhas não utilizam somente os veículos de grande porte para o transporte. Assim como no tráfico de drogas, também fazem uso de veículos de passeio, roubados ou furtados. Esses carros são adulterados com placas clonadas, algo que demonstra, inclusive, que o contrabando se liga com outros delitos. Por vezes, os grupos preferem utilizar comboios, com série de carros carregados de cigarros contrabandeados partindo ao mesmo tempo. Não é incomum os bandidos removerem até mesmo os bancos traseiros para permitir que maior quantia seja transportada numa mesma viagem.
— Essas organizações criminosas, como qualquer outra, possuem vários braços. Quem traz cigarro, traz maconha, trafica armas. De todas as formas, eles tentam ludibriar a fiscalização. Quando é veículo de passeio, preenchem até a altura do vidro, e quem olha não vê que está carregado. Ou utilizam calços nas molas, para não dar aparência de veículo pesado. Num primeiro momento, não se desconfia. É preciso abordar para localizar a carga. É um mercado extremamente lucrativo para os grupos criminosos — afirma Paveck.
Quando chegam ao destino final, que são comércios onde passam a serem vendidos para os consumidores, os cigarros podem ser encontrados pela metade do valor do produto legal, principal estratégia para atrair consumidores. A venda de cigarros contrabandeados, além de ser ilegal, é considerada problema de saúde pública, já que não há qualquer garantia de procedência para quem consome esse tipo de produto.
Penalidade
No caso de Veranópolis, cinco pessoas acabaram presas em flagrante pelo crime de contrabando. Além do condutor, foram detidos os motoristas dos outros dois carros e duas pessoas que estavam na carona. Também foram encontrados R$ 21 mil em dinheiro, que foram entregues, assim como a carga de cigarros contrabandeados, à Receita Federal. A pena para contrabando prevista pela legislação brasileira é de dois a cinco anos de reclusão.