A Polícia Civil tem duas hipóteses centrais para a morte de Gabriel Marques Cavalheiro, 18 anos, em São Gabriel, na Fronteira Oeste. O jovem, que desapareceu após uma abordagem da Brigada Militar no dia 12 de agosto, teve o corpo encontrado no fim da tarde da última sexta-feira (19). Três policiais militares tiveram a prisão preventiva decretada pela Justiça Militar.
Os dois soldados e um sargento, que não tiveram os nomes divulgados, são investigados por homicídio doloso (quando há intenção de matar) ou com dolo eventual (quando se assume esse risco). Chefe da Polícia Civil, o delegado Fábio Motta Lopes afirma que é essencial aguardar o resultado da perícia — que indicará a causa da morte do jovem — para a apuração dos fatos.
— É a perícia que vai dizer se o jovem morreu por afogamento, ou se ele tem sinais, por exemplo, de agressão. Esse é um detalhe que é importante para saber se foi agredido, morto e jogado no açude. Se ele tem ou não sinais aparentes de lesão ou se não tem qualquer lesão e morreu por afogamento — afirma.Quando foram ouvidos, os PMs afirmaram em depoimento que levaram Gabriel até a localidade de Lava Pé e que ele foi deixado no local. O jovem, no entanto, residia com familiares no mesmo bairro onde foi abordado pela BM, após o chamado de uma moradora. A mulher desconfiou do jovem e telefonou para a polícia.
Uma gravação de câmera de segurança registrou uma viatura da BM, que seria a mesma em que Gabriel foi colocado dentro, em deslocamento para o local em que o jovem teria sido deixado, e retornando seis minutos depois. O registro do GPS da viatura confirmou que foi feita uma parada naquele local com duração de um minuto e 50 segundos naquela noite.
Mesmo que o jovem tenha morrido afogado ao entrar no açude ou cair nas águas, a Polícia Civil investiga outra possibilidade que é a do crime cometido com dolo eventual. Neste caso, é levado em conta o fato de que os PMs teriam assumido o risco de produzir a morte, ao abandonarem Gabriel, que não conhecia o local, à noite, nas proximidades de um açude.
Soma-se a isso o fato de que o jovem estaria supostamente embriagado. Antes de ir até a casa da vizinha que acionou a BM, pouco depois das 23h, o jovem passou em um bar que fica na mesma rua. Segundo o dono do estabelecimento, o rapaz comprou uma garrafa de Corote, de 500ml, bebida cujo teor alcoólico é de 13,5%.
— Uma das hipóteses que estamos investigando, portanto, é o homicídio doloso, com dolo direto, que é a possibilidade de ele ter sido espancado e o corpo ocultado. Ou com dolo eventual. Se abandonaram um menino, no mínimo assumiram o risco de produzir a morte, quando deixaram alguém que não conhecia o local, supostamente embriagado, à beira de um açude — diz o delegado.
Além da investigação da Polícia Civil, há um inquérito policial militar em andamento por parte da Corregedoria-Geral da BM. Em nota, a BM afirmou que “em caso de comprovação do envolvimento dos militares, todas as medidas de responsabilização serão adotadas, sempre resguardando o direito à ampla defesa e ao contraditório”.
Despedida e revolta
O corpo de Gabriel foi enterrado na manhã deste domingo (21) no Cemitério Municipal de São Gabriel. Em homenagem ao rapaz, um grupo de cavalarianos ficou à frente do cortejo porque, segundo os parentes, Gabriel era apaixonado por cavalos. Salva de palmas marcou o momento em que foi colocado na sepultura. Sobre o ataúde, foi depositado chapéu preto de cavalaria. Logo depois, ouviram-se gritos pedindo por justiça.
Entre as vestes usadas para cobrir o corpo do garoto, estava um chapéu do Exército. O jovem deixou Guaíba uma semana antes do sumiço para residir com familiares em São Gabriel, onde se apresentaria para o serviço militar. Amigo e vizinho do rapaz em Guaíba, Lucas dos Santos Gomes, 28 anos, fez parte do grupo que rumou até São Gabriel para acompanhar as cerimônias de despedida. O auxiliar de logística lembrou o sonho de Gabriel.
— Ele falava repetidamente nisso. Até nas brincadeiras, ele já marchava como uma pessoa do quartel. Era o sonho dele. É revoltante. O Gabriel era sensacional. Era o filho que qualquer pai gostaria de ter. É inexplicável. Queremos uma resposta da justiça. A população está revoltada. É algo muito dolorido para todos nós — desabafa Lucas.