Uma espécie de véu que recobre a estrutura da antiga sede da Secretaria da Segurança Pública (SSP) do Estado, na Voluntários da Pátria, em Porto Alegre, pode não parecer, mas é uma das principais etapas para garantir proteção durante a implosão do prédio. As telas começaram a ser fixadas nos arredores da estrutura atingida por incêndio para evitar que fragmentos sejam lançados e causem danos externos. Nos próximos dias, serão realizadas outras etapas: instalação dos explosivos, orientação dos moradores no entorno e desocupação da área. A detonação ocorrerá no domingo (6), às 9h, quando o edifício deve vir abaixo em sete segundos.
A instalação das telas de proteção iniciou ainda na tarde de segunda-feira (28), quando operários começaram a cercar o prédio com o material. Durante a implosão, ocorrerão centenas de pequenas detonações, que lançam fragmentos. Esses destroços poderiam sair do prédio e atingir algum bem, imóvel ou mesmo uma pessoa – num raio de 300 metros, a área deverá estar totalmente isolada e desocupada. É por isso que a equipe está fazendo o chamado envelopamento. A tela usada é produzida sob encomenda e tem resistência maior do que as empregadas nas fachadas de obras.
— São telas sobrepostas, normalmente de quatro a cinco camadas, que representam uma muralha, uma proteção com resistência extraordinária quanto ao risco de algum fragmento ser lançado para além da área de proteção e de operação. É uma das etapas mais importantes porque contempla essa preocupação de não lançar nenhum fragmento — explica o engenheiro de minas Manoel Jorge Diniz Dias, um dos responsáveis pela operação.
As telas são içadas com cordas e instaladas nos andares inferiores, os mesmos onde serão colocados os explosivos. Serão necessários ainda mais dois a três dias, segundo o engenheiro, para que os operários da FBI Demolidora, empresa responsável pela operação, concretizem essa etapa. O tempo, que na segunda-feira estava instável, dificultando o trabalho, foi mais favorável nesta terça (1º). A expectativa é de que permaneça assim nos próximos dias, permitindo que a instalação das telas seja agilizada.
Nem sempre o envelopamento é um recurso possível de ser usado na implosão. Quando comandou a implosão do edifício Palace II, no Rio de Janeiro, em fevereiro de 1998, por exemplo, o engenheiro não pôde recorrer à estratégia. Com apenas cinco horas para executar a detonação, foi preciso abrir mão de alguns procedimentos.
— A parte que restava do prédio estava condenada. Não havia tempo sequer para qualquer medida adicional, então eliminamos a figura das telas. Foi impossível adotar a medida porque as condições de segurança eram muito extremas. Mas o planejamento contemplou a detonação num único andar, no subsolo, para não colocar em risco prédios vizinhos nem sequer vidraças — recorda.
Em outra implosão do qual fez parte da operação, de um prédio de 16 andares em São Paulo, em fevereiro de 2008, foram usadas as telas de proteção. O edifício, na Avenida Engenheiro Luís Carlos Berrini, cercado por outras construções, foi implodido em quatro segundos, sem causar danos nos arredores.
No caso da antiga sede da SSP, foi possível instalar as telas, mas o fato de o local ter sido atingido por incêndio torna a operação complexa. A condição ideal é que a estrutura esteja intacta, permitindo, por exemplo, analisar o projeto da obra. Assim como no Palace II, como parte do edifício já está destruída, isso é impossível na implosão na Capital. É necessário contar com a expertise de todos os membros da equipe para avaliar as condições e antecipar riscos.
— A implosão é uma obra ao contrário. Todo esse conhecimento que vamos reunindo para entender como se comporta uma estrutura em colapso está na figura muito menos do engenheiro e muito mais dos encarregados, ajudantes. É por meio deles que conseguimos conhecimento e coragem para enfrentar uma situação como essa. O valor que esse olhar deles tem para nós é extraordinário. Nessa hora, a engenharia fica em segundo plano — avalia Dias.
Desocupação da área
Além do envelopamento, outras etapas precisam ser vencidas até que o imóvel seja efetivamente implodido. A operação conta, por exemplo, com estratégias que visam reduzir os riscos. Uma delas começará a ser colocada em prática ainda na quinta-feira (3), quando a Defesa Civil passará a percorrer comércios e residências num raio de 300 metros do prédio para alertar sobre a obrigatoriedade de desocupação. Nas visitas, serão distribuídos materiais impressos com orientações para os moradores e já serão adiantadas possíveis situações.
— A Defesa Civil vai verificar, por exemplo, se há alguma pessoa com deficiência, que não tenha condições de locomoção, e já prever a estrutura necessária no dia. Ou mesmo alguém que não tenha parentes, amigos, para ir, durante o período da implosão. Tudo isso será mapeado antecipadamente — afirma o vice-governador e secretário de Segurança, Ranolfo Vieira Júnior.
Entre as orientações que serão repassadas aos moradores estão a de fechar o registro do botijão de gás, conferir se todas as portas e janelas estão cerradas, desligar a chave geral de energia, não deixar veículos estacionados nas ruas, somente dentro das garagens, e levar junto os animais de estimação. É necessário que as pessoas deixem as residências até as 7h de domingo.
Explosivos
Na sexta-feira (4) e no sábado (5), serão instalados 200 quilos de explosivos e os acessórios para a detonação. Esse trabalho é realizado pelos chamados blasters, ou cabos de fogo, que são profissionais com treinamento para o manuseio desse tipo de material. Antes disso, o transporte contará com escolta privada, além do monitoramento por parte do Exército e das equipes de segurança do governo. Os explosivos serão inseridos dentro de furos horizontais abertos nos pilares do prédio, nos andares inferiores.
— A imagem da implosão está muito associada aos explosivos. Mas, nesse espetáculo, o explosivo não é o ator principal, e sim, os detonadores. Em seu bojo, eles possuem pequenas cargas de explosivos, com elemento de retardo, que faz com que as detonações ocorram uma depois da outra, com milésimos de segundo de diferença. Isso permite que detone centenas de quilos de explosivos colado a outros prédios, sem causar danos — explica o engenheiro.
Somente na manhã de domingo, minutos antes da implosão é que a equipe irá fazer a ligação do circuito do detonador principal. É por meio dele que às 9h será dado início à implosão. Ao final dos sete segundos, 20 mil toneladas de escombros devem vir ao chão.
O dia da implosão
No domingo, todo o perímetro de 300 metros no entorno do prédio será esvaziado – já no sábado, a partir das 18h haverá controle de estacionamento de veículos. A rodoviária funcionará temporariamente no Terminal Conceição, das 7h às 12h, e a Trensurb só operará até a Estação Farrapos – haverá ônibus até a Estação Mercado. Antes da implosão, serão emitidos cinco alertas sonoros até iniciar a contagem regressiva.
Após a implosão, os técnicos esperarão alguns minutos até a poeira se dissipar e se aproximarão da área. Após a avaliação da situação, tanto no prédio como nos imóveis vizinhos, a área será liberada. Caso seja necessário, haverá equipes em prontidão para realizar reparos. A intenção da equipe é que essa liberação ocorra antes do meio-dia para que a rotina da cidade volte logo ao normal.
Dentro do terreno, ainda haverá trabalho a ser realizado pelos próximos 30 dias após a implosão. A primeira etapa é a fragmentação do material, que precisa ser separado, antes do transporte. Para isso, serão usadas máquinas de grande porte, com intuito de diminuir o tamanho das estruturas e disponibilizar os materiais para destinação. Se a localização do prédio, num dos principais acessos de Porto Alegre, é fator que complica o momento da implosão, para o transporte dos resíduos deve ser ponto positivo.
– É uma rota muito favorável. Vamos ter todo empenho no sentido de liberar o terreno para o governo do Estado o mais breve possível – diz o engenheiro.
Ao longo de março, o governo deve definir qual o destino do terreno. Entre as possibilidades, estão a de reerguer edifício no local ou permutar a área com a iniciativa privada para que seja construída nova sede da SSP em outra área.
– A implosão é mais um passo importante depois dessa tragédia. Em primeiro lugar, o objetivo é eliminar qualquer risco às pessoas. Esse prédio está avariado, tem possibilidade de cair. A primeira peça importante é garantir a segurança. Além disso, também tem aspecto até estético, do prédio como se encontra, na principal via de acesso da nossa Capital. E o terceiro é essa questão que, para tomar qualquer decisão final, tudo passa pela destruição do prédio. Antes disso, não dá para falar em nada – afirma Ranolfo.